Mercado de arte
Texto
Definição
Considerando que um mercado depende de um produtor, um produto a ser trocado ou vendido e um consumidor interessado em adquirir ou usufruir tal produto, conclui-se que o mercado de arte é tão remoto quanto a própria arte. Mesmo antes do estabelecimento da noção moderna e liberal de mercado, guiado pelas leis da oferta e da procura, e no qual homens livres trocam espontaneamente seus produtos ou mercadorias na esfera pública, o artista já possui um público consumidor para seu trabalho. Na Grécia a Cidade-Estado monopoliza a demanda de obras de arte; na Roma de Augusto tanto a corte quanto particulares exercem o mecenato em ampla escala. A Igreja domina quase totalmente as encomendas na Idade Média e permanece como um dos mais importantes financiadores de obras de arte pelo menos até o século XVII (no Brasil, até o final do século XVIII).
Nota-se uma pequena mudança no quadro na Idade Média Tardia, em que a maioria das encomendas para obras de arte é feita por indivíduos pertencentes à próspera classe média. A Igreja não constitui mais o único encomendante dos arquitetos e artistas; agora, com o desenvolvimento das cidades, muitos edifícios precisam ser projetados e decorados para os integrantes das cortes, governantes e mercadores em ascensão. O pleno desenvolvimento dessa situação se dá durante o Renascimento. Amplia-se o mercado secular para obras de arte. Os lares dos ricos cidadãos, assim como os castelos e palácios da nobreza passam a ser decorados com pinturas e esculturas. Presencia-se nesse período uma outra mudança fundamental para a história do mercado de arte: começa a surgir o tipo moderno de consumidor de arte, o connoisseur ou colecionador, que diferentemente do antigo encomendante, compra ou não o que lhe é oferecido. Conseqüentemente, o artista passa a trabalhar de forma mais independente tanto da clientela quanto das guildas.
Durante o período Barroco, ao lado do mecenato eclesiástico, com forte presença na Itália, a monarquia absolutista na França torna-se promotora e consumidora de obras de arte, inaugurando um modo de produção estatal inédito até então. O governo pretende dissolver as relações pessoais entre o artista e o público e fazê-los diretamente dependentes do Estado. Para isso, é fundada, no século XVII, a Academia Real de Belas-Artes, instituição de ensino que garante o aprendizado, a circulação das obras e principalmente, a hegemonia dos estilos pré-determinados. A experiência francesa tenderá a ser seguida por outros países.
É na Holanda protestante que vemos nascer o comércio de obras de arte com feição semelhante ao de hoje. Naquele país, por uma série de injunções sociais, a burguesia encontra-se no centro do poder. A abundância de capital da qual essa classe goza, permite que investa em artigos de mobiliário e decoração, principalmente quadros. Mesmo as pessoas de outras classes podem participar desse tipo de consumo. Os artistas vendiam seus trabalhos diretamente em feiras, em geral por um preço menor do que de um boi, ou através de marchands. Apesar do alto grau de autonomia conquistado pelo mercado de arte, ocorre pela primeira vez na história da arte ocidental uma verdadeira crise por causa do excedente de artistas e da superprodução.
O boom desse mercado livre, que não é regulamentado nem pela corte nem pelo Estado, leva a uma situação de feroz concorrência, da qual são vítimas os talentos mais singulares do período. Se por um lado os artistas ganham em liberdade nessa nova ordem liberal, a concorrência no domínio da arte leva a uma situação de segurança. Os motivos pelos quais um artista é bem-sucedido dependem em menor grau de sua qualidade, e vão da mera especulação de mercado às mudanças de direção no gosto do público. Rembrandt (1606 - 1669) não seria o único a sofrer as conseqüências dessa nova ordem ainda no século XVII. A relação conflituosa entre o artista e o mercado alcança um novo patamar no século XIX, quando o capitalismo se institui como sistema econômico dominante e a burguesia se encontra finalmente no poder. Muitas vezes o valor artístico de uma obra não corresponde a seu valor de mercado, o que gera uma série de "confusões" no decorrer da história. Notável é o caso dos pintores impressionistas: firmemente negligenciados por seus contemporâneos abastados, durante todo século XX foram alvo de grandes especulações do mercado de arte.
Em termos gerais, a estrutura liberal domina o mercado artístico até nossos dias: o artista agora é um profissional livre portador de uma mercadoria e precisa, como todos os outros profissionais liberais, do mercado para sobreviver. No entanto, no decorrer dos anos, tal estrutura foi incrementada com uma série de novas instâncias que fazem o papel de mediadores e orientadores do comprador. Já no século XVII as exposições e salões são um fator indispensável na vida artística, à medida que diminui o apoio do Estado aos artistas e esses precisam ampliar o mercado para suas obras. Atualmente galerias, revistas especializadas, a crítica de arte, os curadores e os museus, são alguns dos importantes elementos intermediários entre o artista e seu público consumidor. Como tal, o mercado de arte está ligado à situação econômica geral, o que em alguns momentos gera uma extrema vulnerabilidade material para os artistas. Apesar disso, ele se configura como uma das instâncias fundamentais para o sistema moderno de circulação de arte.
Fontes de pesquisa 7
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- WARNKE, Martin. O artista da corte: os antecedentes do artista moderno. São Paulo: Edusp, 2001.
Como citar
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MERCADO de arte.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/termo3803/mercado-de-arte. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7