Pintura de Interior
Texto
Definição
O termo designa uma ramificação da pintura de gênero, especificamente as obras que representam cenas do cotidiano doméstico e aquelas ocorridas em espaços interiores: salas, quartos, cozinhas etc. Ainda que seja possível localizar registros de ambientes interiores em diversas tradições e épocas, a expressão faz referência sobretudo à pintura da Holanda protestante do século XVII, onde se desenvolve um estilo sóbrio e realista, comprometido com a descrição de cenas rotineiras, de situações da vida diária, de homens realizando seus ofícios, de mulheres no interior das casas e de festas comunitárias. As imagens se particularizam pela riqueza de detalhes, pela precisão e apuro técnico, na contramão das formas barrocas que tomam os países da Europa católica. Vale lembrar que a expressão pintura de interior, ainda que parte integrante do vocabulário da crítica e da história da arte, é empregada de modo esporádico, encontrando-se ausente em boa parte dos dicionários e enciclopédias dedicadas às artes visuais. De modo geral, o termo pintura de gênero é aquele mais amplamente adotado.
A pintura flamenga, já nos séculos XV e XVI, mostra-se sensível à descrição dos registros triviais do cotidiano. O célebre quadro Giovanni Arnolfini e Sua Esposa (1434) de Jan van Eyck (ca.1390-1441) é revelador dessa orientação descritiva da pintura holandesa. Basta notarmos o cuidado do pintor com as texturas reais das faces do casal em primeiro plano e de suas vestimentas, bem como a composição detalhada do ambiente interior: os móveis, os candelabros, o cão e o espelho ao fundo em que se encontram refletidos o casal (de costas) e duas outras figuras. Peter Bruegel, o velho (ca.1525-1569), se notabiliza pelas cenas de gênero que realiza, em especial, as cenas da vida camponesa: os aldeões no trabalho e em festejos variados. Dentre elas, algumas podem ser mais claramente classificadas como pinturas de interior, por exemplo, Um Casamento Aldeão (1565). A cena, ocorrida no interior de um celeiro, repleta de personagens e situações, exemplifica a opção primeira de sua pintura: a riqueza de detalhes, o colorido e a técnica precisa. Muita coisa ocorre simultaneamente: em primeiro plano, os pratos transportados por dois homens de avental branco; no canto esquerdo, um homem serve cerveja e um menino brinca; à mesa, as pessoas comem e conversam, enquanto um grupo de músicos toca, de pé; no fundo, outros tentam entrar pela porta. O filão aberto por Bruegel vai ser explorado pelas obras animadas e humorísticas de Jan Steen (1626-1679), popular pelas tavernas e ambientes festivos que descreve com atenção aos coloridos, gestos e poses. Dentre suas obras, algumas são pinturas de interiores, como A Festa na Osteria (1674) e A Festa de Batizado (1664). Jan Vermeer (1622-1669 ou 1670) deixou registros antológicos de cenas de interior como A Leiteira (ca.1660), Mulher Lendo Diante da Janela (ca.1657), Jarro de Vinho (ca.1658-1660), A Lição de Música (ca.1662-1665), entre outras. O registro de cenas da vida doméstica, por meio de imagens harmoniosas, o foco colocado em uma ou duas figuras - que realizam tarefas domésticas ou em momentos de lazer - e a luz que entra pelas janelas, á esquerda da composição - em que predominam amarelos, azuis e tons acinzentados - são traços destacados da pintura de Vermeer.
No Brasil, a pintura de gênero é realizada pelos pintores do final do século XIX e início do século XX. No interior da ampla produção de Debret (1768-1848), por exemplo, o registro de cenas da vida cotidiana, dos ambientes domésticos e do mundo do trabalho está presente em diversos trabalhos, como Uma Senhora Brasileira em seu Lar (ca.1823), Botica e Interior de uma Casa de Ciganas (1823). Almeida Júnior (1850-1899), por sua vez, realiza pinturas de interior em diferentes momentos: Quarto do Artista em Paris (1886), O Importuno (1898). A pintura de gênero, e nesse caso mais detidamente o registro de ambientes interiores, encontra expressão em obras de Modesto Brocos (1852-1936) - Engenho de Mandioca (1892) -, de Belmiro de Almeida (1858-1935) - A Tagarela (1893) e Arrufos (1887) - e de Henrique Bernardelli (1858-1936), por exemplo Interior Italiano (s.d.). E nos anos 1920 convém recordar a produção francesa de Anita Malfatti (1889-1964).
Fontes de pesquisa 4
- ALPERS, Svetlana. A arte holandesa no século XVII. Tradução Antonio de Pádua Danesi, São Paulo, EDUSP, 1983, 432 pp. il. p&b. color (Coleção Texto e Arte).
- CHILVERS, Ian (org.). Dicionário Oxford de arte. Tradução Marcelo Brandão Cipolla. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
- La nuova enciclopedia dell'arte Garzanti. Milano: Garzanti, 1986.
- VÉGH, János. A pintura holandesa. Tradução do inglês, Luiz Oscar Dubeux, Rio de Janeiro, Ao Livro Técnico S/A, 1981.
Como citar
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PINTURA de Interior.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/termo3743/pintura-de-interior. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7