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Enciclopédia Itaú Cultural
Música

José Maurício Nunes Garcia

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 29.08.2024
22.09.1767 Brasil / Rio de Janeiro / Rio de Janeiro
18.04.1830 Brasil / Rio de Janeiro / Rio de Janeiro
José Maurício Nunes Garcia (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1767 - idem 1830). Compositor, cravista, organista, violeiro, mestre-de-capela, padre. Órfão de pai aos 6 anos, fica aos cuidados de sua mãe Vitória Maria da Cruz, filha da escrava Joana Gonçalves. A mãe tem o cuidado direcionar o aprendizado do filho para a música. Ainda criança tem au...

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José Maurício Nunes Garcia (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1767 - idem 1830). Compositor, cravista, organista, violeiro, mestre-de-capela, padre. Órfão de pai aos 6 anos, fica aos cuidados de sua mãe Vitória Maria da Cruz, filha da escrava Joana Gonçalves. A mãe tem o cuidado direcionar o aprendizado do filho para a música. Ainda criança tem aulas de música com Salvador José, "o pardo", professor particular e amigo de sua família. Demonstrando grande facilidade com a música, aos 12 anos torna-se também professor e, aos 16, escreve sua primeira obra Antífona Tota Pulcra Es Maria (Consertad. a 4 voz[es] com dois Violinos Viola e Basso). Aos 17 é um dos fundadores de uma confraria de professores de música, a irmandade de Santa Cecília.

Ingressa no sacerdócio aos 25 anos, tornando-se mestre-de-capela da catedral da Sé aos 30, em 1798, onde tem a sua disposição um grupo de instrumentistas e cantores para os quais pode compor e reger. Obtido o título, o padre deveria agora compor para o calendário litúrgico da catedral, dirigir as obras e atuar como orador. Datam dessa época diversos graduais, dentre eles Justus cum ceciderit (1799) e Alleluia, angelus Domini (1799). Coube-lhe também responder perante o Senado da Câmara pela música que acompanhava as funções anuais, obrigação que lhe trouxe diversos problemas burocráticos em relação ao pagamento dos músicos, principalmente após a chegada da Família Real.

Com a transferência da corte portuguesa para o Brasil em 1808, o padre José Maurício é transferido para a Capela Real, criada pelo príncipe regente de Portugal junto a seu palácio, o que correspondia a um alto cargo. Em 1809, é agraciado com o hábito da Ordem de cristo por D. João VI e, em 1816, recebe do Senado e da Câmara a incumbência de dirigir a missa pela elevação do Brasil a Reino Unido. No ano seguinte, dirige "Doze Divertimentos" para o conjunto instrumental que acompanhou a princesa D. Leopoldina em sua vinda ao Brasil.

D. João VI demonstra grande apreço pelo compositor, apesar disso permanece em situação financeira ruim. A Capela Real não paga por suas composições, nem pelos trabalhos como professor e organista. Como se não bastasse, existe naquele tempo um sistema de "arrematações" por eventos fora do calendário litúrgico, no qual os músicos devem ser pagos por antecipação pelo mestre-de-capela, que é ressarcido depois pelo Senado da Câmara. Repetiram-se as vezes em que o ressarcimento é feito com grande atraso, alternando-se a outras em que simplesmente não é feito, tendo o compositor que ficar com o prejuízo.

O retorno de D. João VI a Portugal em 1821 marca um momento de turbulência política e econômica, que faz parte do processo de independência do Brasil. Para os músicos da Capela Real, o reflexo da situação é sentido diretamente em seus bolsos, através de um grande arrocho salarial. José Maurício, cuja situação financeira está longe de ser boa, vê seu salário ser reduzido a menos de um quarto. O padre-mestre que nunca chega a possuir um piano ou um cravo agora vai sendo levado gradativamente à miséria.

Análise

A atividade musical no Brasil durante quase todo o período colonial funciona basicamente no âmbito das funções religiosas, e a batina pode garantir o respeito frente à sociedade. Então é na igreja onde o jovem José Maurício desenvolve sua carreira musical. Ali pode dedicar-se à composição, à regência e às aulas gratuitas que oferece aos que não têm condições de pagar por elas. Desse modo, sua produção artística é essencialmente religiosa, tendo composto algo em torno de quatrocentas peças. Dedica a maior parte de sua atividade à composição de missas, novenas, salmos, hinos, vésperas, motetos, Te Deum, matinas e outras variantes da liturgia, tendo ainda composto música dramática, modinhas e música para orquestra, como a abertura Zemira, composta em 1803.

No final do século XVIII, O Rio de Janeiro concentra o principal centro de comercio internacional brasileiro. Na cidade, nova sede do vice-reino do Brasil, são criadas primeiro as condições para um dinamismo econômico e alguma efervescência cultural. O Rio começava a criar um cenário profissional para seus músicos: tocar em festas religiosas e comemorações patrocinadas pela Câmara Municipal foram as primeiras maneiras que José Maurício encontrou para ajudar nas despesas de sua casa. Os músicos passam a organizar-se em irmandades, formadas, principalmente, por profissionais liberais e comerciantes, que se reunem em torno de certa devoção.  A irmandade, variando de acordo com sua possibilidade financeira, pode construir sua própria igreja e organizar seus músicos, mulatos livres na sua maioria, para compor o serviço litúrgico e as festas em torno do padroeiro. José Maurício escreveu, por exemplo, vários conjuntos de música com o título de Vésperas para o dia do santo patriarca no intervalo entre 1799 a 1810, ou ainda Música do dia do Ofício Geral da Irmandade. São peças de caráter funcional, servem às intenções do ofício religioso.

Com a transferência da corte, o padre José Maurício é nomeado mestre de música da nova Capela Real. Cargo de grande importância, deve escrever agora para orquestras maiores e para os melhores músicos da corte. Esse período coincide com o de maior produtividade na carreira do compositor não por acaso: as exigências da Capela são muitas, e o compositor pode escrever para formações que até então não tinha oportunidade. Entre 1808 e 1811 o número de obras do catálogo do padre se intensifica visivelmente, multiplicando sua produção. Mas a carga exagerada de trabalho e a falta de pagamentos levam-no à debilidade física e moral. A relação com os músicos vindos da Capela Real de Lisboa é bastante penosa para o padre compositor: insatisfeitos por serem dirigidos por um brasileiro mulato, o padre-mestre é acusado de, entre outras, não ter frequentado conservatórios, nunca ter saído do Brasil e reger sem ter aprendido. Mas, principalmente, sempre são diretos ao acusarem seu "defeito físico visível", a cor de sua pele. Frente à situação, D. João VI manda trazer seu antigo mestre-de-capela Marcos Portugal - de tez branca e origem lusa - que usufrui mais privilégios que o padre brasileiro.

Assim, José Maurício vive entre dois mundos: conhece a música e a sofisticação das artes praticadas na Europa no final do século XVIII, ao mesmo tempo em que a cor de sua pele o prende a um mundo cruel e sem direitos. Sua música procura solucionar de algum modo esse conflito que tão intensamente o envolve. Na leveza de sua escrita transparece a admiração por mestres europeus como Mozart e Haydn. O padre José Mauricio Nunes Garcia também é um dos iniciadores da música popular no Brasil com a publicação das modinhas de sua autoria Beijo a Mão que Me Condena, No Momento da Partida, Meu Coração Te Entreguei (1837) e Marília, Se Não Me Amas, não Me Digas a Verdade (1840). 

Fontes de pesquisa 5

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  • JOSÉ MAURÍCIO Nunes Garcia: um brasileiro nos ouvidos da Corte. Direção: KANJI, Ricardo; VOLPATO, Reinaldo; Fotografia: RAULINO, Aloysio; Roteiro: NAVAS, Vítor; Produção: Telebrás; CEPEC; Prod. executiva: CARVALHO, Wagner; XAVIER, Rubens. São Paulo: CEPEC - Centro de Produções Editoriais e Culturais, 199_. 1 DVD : 1 ex., NTSC, col., 29min01 (História da música brasileira, 5).
  • LIMA, Rossini Tavares de. Vida e época de José Maurício. Edição Elo: São Paulo, 1941.
  • MATTOS, Clêofe Person de. Catálogo temático de José Maurício Nunes Garcia. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1970.
  • MATTOS, Clêofe Person de. José Maurício: biografia. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1997.
  • SCHUBERT, Guilherme. "O Brasil de ontem na vida do padre José Maurício". Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro,V. 326, p. 327-350, jan./mar. Rio de Janeiro: IHGB, 1980.

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