Osman Lins
Texto
Biografia
Osman da Costa Lins (Vitória de Santo Antão PE 1924 - São Paulo SP 1978). Romancista, contista, dramaturgo e ensaísta. Filho de um alfaiate e de uma dona de casa, perde a mãe logo depois do nascimento. Passa a infância em sua cidade natal, mudando-se para capital do estado, aos 16 anos, após terminar o secundário. Ingressa no curso de finanças na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Recife, graduando-se em 1946. Ainda nessa época, começa a trabalhar no Banco do Brasil. Inicia em 1952 a redação de O Visitante, seu romance de estreia, publicado em 1955. Nessa época, colabora no Diário de Pernambuco. Em 1960, conclui curso de dramaturgia na Escola de Belas-Artes da mesma universidade e, no ano seguinte, vai à Europa como bolsista da Aliança Francesa. De volta ao Brasil, muda-se, em 1962, para São Paulo. Em 1970, torna-se professor de literatura brasileira na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Marília, São Paulo, instituição em que também defende seu doutorado, com tese sobre Lima Barreto (1881 - 1922). Tendo já publicado seus dois mais importantes livros, Nove, Novena (1966) e o experimental Avalovara (1973), e desencantado com o ensino brasileiro - assunto que discute em Do Ideal e da Glória. Problemas Inculturais Brasileiros (1977) -, pede exoneração da faculdade em 1976, quando passa a se dedicar com exclusividade à literatura. A partir de então, colabora na imprensa, em veículos como o Suplemento Literário de O Estado de S. Paulo, e escreve roteiros para a televisão.
Comentário crítico
A obra ficcional em prosa de Osman Lins divide-se em duas fases. A primeira delas corresponde à prosa editada entre 1955 e 1963, estruturada a partir de recursos narrativos tradicionais. Já a publicação de Nove, Novena, em 1966, inaugura a experimentação formal e propõe reflexões sobre a natureza da ficção e do ofício do escritor.
O romance O Visitante (1955), estreia de Lins em livro, apresenta o caso amoroso e proibido de Celina, professora particular, e Arthur, professor prestigiado na cidade. A narrativa em terceira pessoa transcorre quase que exclusivamente no âmbito privado, isto é, no interior da casa da personagem feminina - cujos pensamentos estão no foco de atenção do narrador. Já o amante é retratado de forma mais distanciada, sem revelar sua dimensão psicológica. Outras figuras atuam apenas indiretamente, a partir de referências. Essa configuração sustenta uma espécie de maniqueísmo do enredo: Celina é o bem que será ameaçado pelo mal de Arthur. O choque entre os antagônicos, porém, em vez de conduzir à destruição plena é responsável por transformações da mulher, capaz de superar a própria fragilidade.
A trajetória de uma personagem que, a despeito das condições externas, consegue se afirmar está presente também em O Fiel e a Pedra (1961). Embora se assemelhe a um romance regionalista, devido à ambientação em uma zona rural nordestina, a narrativa é antes de tudo psicológica: os dados externos são convocados na medida em que as personagens percebem a realidade de modo particular. Os dilemas enfrentados pelo protagonista, Bernardo, após a perda de um filho e diante do embate com um autoritário senhor de terras, revestem-se, frequentemente, de intenso lirismo.
O livro seguinte, Marinheiro de Primeira Viagem (1963), muitas vezes compreendido como o mero relato da experiência vivida pelo autor em 1961 na Europa, é, na opinião de Sandra Nitrini, um marco fundamental na obra de Osman Lins. A narrativa, de caráter ficcional, apresenta relato fragmentado, propõe-se a refletir sobre o ato criador e mostra-se contaminada pela linguagem da pintura: segundo Sandra, "materializa uma viagem sem retorno, no plano da realização literária, da primeira para a segunda fase de sua obra".
As inovações formais tornam-se evidentes em Nove, Novena. Já não há a relação de causa e efeito característica da prosa de ficção, e as personagens raramente têm nome, muitas vezes sendo identificadas por sinais gráficos. Os Confundidos, uma das nove narrativas que compõem o livro, é um diálogo entre um casal. Em princípio, cada um se identifica por um travessão graficamente particular - a discussão sobre o relacionamento, surgida de uma crise de ciúmes, levará, contudo, à diluição dos limites entre um e outro, a tal ponto que se afirma: "Poderíamos estar felizes, eu e eu, muitas horas felizes".
Avalovara (1973), considerado o principal livro do autor, está também centrado na relação amorosa - mais especificamente, no relacionamento de Abel com Roos e depois com Cecília, ambos operando como uma espécie de preparo para o encontro do narrador com uma mulher sem nome, identificada apenas por um símbolo.
O romance propõe um complexo jogo de leitura, cujo percurso é dado, nas páginas iniciais, por uma espiral e um quadrado. Dentro do quadrado se organiza um palíndromo - Sator arepo tenet opera rotas: a cada uma de suas letras corresponde uma linha narrativa. Uma das traduções para a frase em latim é oferecida pelo narrador: "O Lavrador sustém cuidadosamente o mundo em sua órbita". Essa formulação reforça a deliberada tentativa de chamar a atenção para o artifício da obra literária: o narrador pertence a um mundo ficcional criado pelo autor - em Avalovara, contudo, também o narrador constrói esse mundo.
A dramaturgia de Osman Lins, conhecida do grande público a partir da adaptação de Lisbela e o Prisioneiro para o cinema, em 2003, também sofre o impacto de Nove, Novena. A mistura entre os gêneros épico, dramático e lírico presentes na primeira fase se desenvolve em peças que, conforme as reunidas em Santa, Automóvel e Soldado (1975), questionam os limites do teatro - sobretudo com base na desvinculação entre texto e personagem.
No ensaio, do qual se destaca Guerra sem Testemunhas, o autor reflete sobre o ofício do escritor, analisando o meio editorial brasileiro e problematizando, em tom confessional, a própria atuação. Nesse livro, afirma acreditar em uma inexorável segregação entre o artista e o mundo: "O mundo necessita de seus escritores na exata medida em que tende a negá-los". Esse embate, na opinião de Osman Lins, sendo fruto da inadequação e da resistência do escritor à realidade, é justamente o que torna necessária a criação.
Obras 1
Espetáculos 14
Fontes de pesquisa 7
- ANDRADE, Ana Luiza. Osman Lins: crítica e criação. São Paulo: Hucitec, 1987. 239p.
- DIAS, Maria Teresa de Jesus. Um teatro que conta: a dramaturgia de Osman Lins. Tese (Doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2004. 213p.
- IGEL, Regina. Osman Lins: uma biografia literária. São Paulo: T. A. Queiroz; Brasília: Instituto Nacional do Livro, 1988. 174p.
- LINS, Osman. O escritor e o teatro. In: ______. Guerra sem testemunhas: o escritor, sua condição e a realidade social. São Paulo: Ática, 1974, p. 91-118.
- MOURA, Ivana. Osman Lins. O matemático da prosa. Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2003. 113p.
- NITRINI, Sandra. Posfácio. In: LINS, Osman. Lisbela e o prisioneiro. São Paulo: Planeta, 2003, p. 111-118.
- ROSENFELD, Anatol. Osman Lins e o teatro atual. In: ______. Prismas do teatro. São Paulo: Perspectiva, 2000, p. 189-198.
Como citar
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OSMAN Lins.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa4477/osman-lins. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7