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Enciclopédia Itaú Cultural
Teatro

Fernando Villar

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 18.07.2021
11.07.1959 Brasil / Rio de Janeiro / Petrópolis
Fernando Antônio Pinheiro Villar de Queiroz (Petrópolis, Rio de Janeiro, 1959). Autor, encenador, diretor e professor universitário. O contato com Helena Barcellos e o teatro marca sua graduação em artes plásticas na Universidade de Brasília (Unb)(1979-1983). Em 1981 estreia como iluminador em O Exercício, de John Lewis Carlino, na remontagem de...

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Fernando Antônio Pinheiro Villar de Queiroz (Petrópolis, Rio de Janeiro, 1959). Autor, encenador, diretor e professor universitário. O contato com Helena Barcellos e o teatro marca sua graduação em artes plásticas na Universidade de Brasília (Unb)(1979-1983). Em 1981 estreia como iluminador em O Exercício, de John Lewis Carlino, na remontagem de B. de Paiva. Em 1982, inicia carreira de ator em Pequenos Burgueses, dirigido também por B. de Paiva e na adaptação de Guilherme Reis de Pedro e o Lobo, assinando, com Márcia Sant'anna, os figurinos das duas montagens. Em 1983, espetáculos com Hugo Rodas, Lúcia Sander e o Udi Grudi complementam sua formação, antes de estrear como autor, encenador e diretor em Você tem uma caneta azul pra prova?, com o Teatro dos Artistas Plásticos.

A repercussão positiva de Caneta azul atrai diferentes artistas da dança, performance e teatro de Brasília que participam de sua segunda peça, Vidas Erradas, ou Pode Vir Que Não Morde (1984). O "fenômeno cultural brasiliense"1 muda o nome de Teatro dos Artistas Plásticos para Grupo Vidas Erradas, com montagens que surpreendem pelo "grande afluxo de espectadores e quase unanimidade de opiniões positivas"2, e que marca a década como "o mais atirado grupo de teatro da cidade."3

Na segunda metade da década, Fernando Villar tem aulas de teatro e dança com Hugo Rodas e mantém um grupo de contato-improvisação com Tica Lemos, Cláudia Trajano e Sérgio Ulhoa. Em 1990 Fernando segue para Inglaterra para especialização em direção no Drama Studio London.

Na volta para Brasília, concebe e dirige Medeações (1992), primeiro trabalho do Teatro Universitário Candango (Tucan), da UnB, onde inicia carreira docente em 1993. Durante essa década, a maioria de suas montagens como ator, autor e/ou diretor são realizadas com o Tucan, ou na Europa. Em 1993 como professor visitante na University of Manchester, concebe e dirige projectØphelia, que remonta com o Tucan, em Brasília, no mesmo ano. Em 1994 volta a Londres para dirigir a primeira montagem profissional inglesa de Nelson Rodrigues, A Kiss in the Gutter (O beijo no asfalto), que estreia no Festival de Edimburgo, antes da temporada londrina. Retorna a Londres para o doutoramento na University of London (1996-2000), ao longo do qual concebe The Key to Hell, livre adaptação de HQ de Neil Gaiman, que Fernando dirige com Mônica Luni, em Oslo, em 1999 e 2000, em uma garagem de bondes abandonada, com atores e não atores de três diferentes continentes. The Key to Hell é considerada pelo Klasse Kampen, como uma das melhores montagens do teatro experimental na Noruega em 1999.4

No retorno ao Brasil em 2001, desenvolve novos trabalhos com o Tucan e com outros grupos e artistas da cidade. Durante essa década investe na visibilidade nacional do Departamento de Artes Cênicas da UnB e na pesquisa e pós-graduação em Arte.5 Em 2007, é professor visitante na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), quando, em disciplina da pós-graduação, roteiriza abstract3F28hamlet, que dirige com Renato Ferracini e Verônia Fabrini. No mesmo ano, cria na UnB o Laboratório Interdisciplinar de Investigação e Ação Artística (LIIAA), que mantêm os grupos CHIA, LIIAA! e Chia Lia Jr., uma parte de sua produção artística intensa com coletivos, eventos e universidades em todas as regiões brasileiras.

Análise

Para o crítico Severino Francisco, "Fernando Villar tem a pulsão da invenção, os saques, a intuição, o senso de espetáculo, a capacidade de tirar surpresas da cartola."6 A narrativa acelerada, fragmentada mas estruturada, pode ser vista em todos os trabalhos de Villar à frente do Grupo Vidas Erradas, servindo como uma crítica pertinente e contemporânea às mudanças comportamentais e de valores que ocorrem com a inserção de novas mídias no cotidiano brasileiro. Segundo Francisco, João e Maria, uma história de verdades e mentiras (1985-1988) exemplifica a estética contestadora de Villar, em "um vídeo-clip teatral em busca de sintonia com a percepção vertiginosa das crianças formadas na era eletrônica, uma fábula cênica com a mira em dois mitos quase indivisíveis: o da visão adulta convencional e o do clichenês teatral infantil que codifica e reforça estes mitos."7

As artes plásticas, o cinema, a televisão, a dança, a música e a performance art influenciam muito as encenações, dramaturgia e direção de Villar. Na década de 1990, nota-se o trabalho ainda mais minucioso com o elenco, com estados emocionais, com a palavra e o texto bem ditos. O experimentalismo da década anterior mantém-se nas décadas seguintes, assim como amplia-se sua indisciplinaridade artística, fortalecida pelo aprofundamento no doutorado sobre interdisciplinaridades artísticas no teatro contemporâneo, levantando hipóteses que Fernando resolve com o uso da produção ímpar do grupo barcelonês La Fura dels Baus, nos anos 1980.

A ação, a imagem, o ritmo e o movimento nas encenações de Fernando prevalecem sobre qualquer "textocentrismo", mesmo em peças em que a fala direta com a plateia permeia todo o espetáculo, como em Medeações, Adeus Inglaterra/Farewell England (1991-1993), Trajetória "X" (2010) ou em Ivan e os Cachorros (2011). Em Adeus Inglaterra, em sua abordagem sobre ser estrangeiro, pode-se ver que "uma simples cadeira pode ser o pretexto para certa coreografia em que a necessidade de decifrar o que nos é estranho é exibida e tematizada."8 No Brasília Cena Contemporânea de 2011, sua direção para Ivan e os Cachorros é comentada pelo site do festival internacional, como "montagem inovadora."9

Ivan é traduzido e dirigido por Fernando, com elenco e equipe de encenação paulistanos e participação de integrantes do CHIA, LIIAA! em 77 offs que permeiam o solo. O coletivo brasiliense tem como objetivo a montagem de somente peças inéditas no Brasil, que discutam temas contemporâneos instigantes, encenando autores como Mariano Pensotti, Caryl Churchill e Hattie Naylor, em estreias nacionais de Laura (2007-2009); Coração Partido (2009) e Ivan e os Cachorros, respectivamente. Em 2010, Fernando escreve e encena com o grupo, Trajetória "X" (2010-11), com base na pesquisa do Grupo Violes (Serviço Social/UnB), sobre exploração sexual de crianças e adolescentes no centro da capital.10

Em suas obras, a forma materializa conteúdos nos quais a aventura humana e a contemporaneidade são analisadas e criticadas, em defesa da diversidade e com o ataque bem humorado, ou ácido, ao sexismo, classismo, racismo e outros preconceitos que questionam nossa civilidade. Mesmo reconhecendo um possível anacronismo de parte da produção teatral contemporânea no império da internet, Fernando Villar celebra a marginalidade do teatro como positiva, por ser alternativa à deturpação midiática e às manipulações da informação que emperram a cultura brasileira. Para ele, o teatro "é fonte inesgotável de possibilidades, é uma linguagem plural, com forte potencial para provocar reflexão"11 e transformação.

Na UnB, Fernando leciona disciplinas de interpretação, encenação, direção e projetos de diplomação, antes de focar-se exclusivamente em interpretação e processos criativos a partir de 2001. Nas fases iniciais dos cursos, dedica-se ao embasamento técnico e criativo do intérprete, mesclando dança, música, Shakespeare e obras contemporâneas. Aborda o teatro performance com turmas intermediárias, e na pós-graduação, investiga práticas cênicas contemporâneas.

A coreógrafa e professora Silvia Geraldi descreve Fernando "como autor diretor, encenador e performador [que] investiga o teatro contemporâneo e suas manifestações interdisciplinares [...] e os diferentes desdobramentos ligados à ação corporal testemunhada."12 Sobre as suas aulas, Geraldi conta "que as intervenções de Fernando Villar eram interdisciplinares ou híbridas por excelência, caracterizando-se tanto pela pluralização das técnicas empregadas nos laboratórios, quanto pela abundância de referências, conteúdos, motivações que ele nos apresentava (indo desde fragmentos coreográficos Bauschianos até estímulos sonoro-musicais e letimotives biográficos)."13 Geraldi ressalta também o uso de improvisações e jogos, de  "poesias pessoais a partir da fricção de universos pessoais e hamletianos" e "a intensidade da corporalidade nesse tipo de processo. O emprego de procedimentos característicos de outras formas interdisciplinares, originárias de tempos/espaços diversos (a colagem/assemblage; as jigs)14 foi recurso amplamente utilizado por Villar."15

Para o jornalista Sergio Maggio, o diretor tem "espetáculos antológicos" e também "transformou-se em um conceituado pesquisador teatral, um estudioso da performance e uma referência internacional no estudo de novas teatralidades."16 A pesquisadora e professora Sílvia Fernandes lista Fernando entre realizadores de "um novo tipo de escrita cênica" contemporânea, que o teórico alemão Hans-Thyes Lehmann denomina de teatro "pós-dramático".17 Segundo Fernando Marques, Villar "realiza verdadeiros quadros vivos e móveis, de forte impacto visual, buscando com o auxílio também indispensável da música, o uso mínimo possível da palavra verbal. Assim, estabelece o trinômio que serve de base para seu processo criativo: verdade, beleza e simplicidade."18

Notas

1. GUERRA, Kido. Um fenômeno cultural brasiliense. Correio Braziliense, Brasília, 16 de jun.1984, p.19.

2. Idem.

3. FRANCISCO, Severino. O caso Greta/ Crítica. Correio Braziliense, Brasília, 9 de set.1987, p.25.

4. HOLVIK, Sigurd Ofstad. Rundtur i Helvete. Klasse Kampen, 09 de nov. 1999, p.13. O tabloide é o segundo maior jornal da Noruega.

5. Em 2001 associa-se à Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-Graduação em Artes Cênicas (Abrace) e é escolhido para ser o vice-coordenador de Renato Cohen no Grupo de Trabalho Territórios e Fronteiras. Em 2002 passa a integrar o Mestrado em Arte Contemporânea do Departamento de Artes Visuais da UnB. Coordena o GT Territórios e Fronteiras, de 2003 a 2008. Integra a direção da Abrace de 2003 a 2010. É do Conselho Editorial de oito publicações artístico-científicas brasileiras, organiza três livros, entre os quais, o Histórias do Teatro Brasiliense (2004) com seu ex-orientando Eliezer Faleiros de Carvalho, e tem várias publicações em livros e periódicos a partir de 1999, com seu primeiro artigo na Romance Quarterly estadunidense.

6. FRANCISCO, Severino. O caso Greta/ Crítica. Correio Braziliense, Brasília, 9 de set. 1987, p.25.

7. FRANCISCO, Severino. João e Maria, história de verdade e mentiras. Correio Braziliense, Brasília, 4 de maio 1985, p.21.

8. MARQUES, Fernando. Um brasileiro na terra de Shakespeare. Correio Braziliense, Brasília, 15 abr. 1993, p.1, capa, Correio Dois.

9. A montagem inovadora de Ivan e os Cachorros. Cena Contemporânea. Festival Internacional de Teatro de Brasília. Disponível em: http://www.cenacontemporanea.com.br/2011/?p=1037. Acesso em: 27 nov. 2011.

10. O Violes é um grupo de pesquisa coordenado pela professora Maria Lúcia Leal do Departamento de Serviço Social da UnB. Como alternativa à apresentação de pesquisas em artigos e conferências, ela convida Fernando a encenar a pesquisa do Violes, A trajetória social de crianças e adolescentes em situação de exploração sexual, na Rodoviária e Setor Comercial Sul (2008-2009). O espetáculo abre o Seminário Nacional sobre Exploração Sexual no Museu Nacional de Brasília e apresenta-se em Brasília e no 24º. Festival Internacional de Teatro Universitário de Blumenau em 2011, com Prêmio de melhor ator para Pedro Lima Silveira. O espetáculo resultante se desdobra na outra versão, Trajetória "X -1" (2012) e na peça curta Trajetória "PL" (2012). No mesmo ano, Trajetória "PL" recebe o Prêmio de Melhor Tratamento de Temática Contemporânea na Cena, no Festival Breves Cenas 4, no Teatro Amazonas em Manaus.

11. SALUSTIANO, Mariana. Entrevista de Fernando Villar. Cena Candanga. Disponível em: http://cenacandanga.blogspot.com.br/search/label/Fernando%20Villar. Acesso em: 20 jun.2009.

12. GERALDI, Sílvia Maria. O estado de ser e não ser das artes performativas contemporâneas. Revista Científica/FAP, jan./dez. 2008, v.3, p.185-199, p.192.

13. Idem, p.194.

14. Segundo Geraldi, as "jigs eram performances típicas do período elisabetano, bastante populares, compostas por improvisos que misturavam dança, música e atuação; aconteciam ao final das apresentações teatrais principais", com deboche e constantes comentários políticos ou religiosos (p.195).

15. GERALDI, Sílvia Maria. O estado de ser e não ser das artes performativas contemporâneas. Revista Científica/FAP, jan./dez. 2008, v.3, p.194-195.

16. MAGGIO, Sérgio. Muito Prazer, Fernando Villar. Criador sem fronteiras. Correio Braziliense, Brasília, 28 de ago. 2011, p.5.

17. FERNANDES, Sílvia. Teatros Pós-Dramáticos. In GUINSBURG, J. e FERNANDES, S. (orgs.). O Pós-Dramático. São Paulo: Perspectiva, 2009, p.23-24.

18. MARQUES, Fernando. Um brasileiro na terra de Shakespeare. Correio Braziliense, Brasília, 15 de abr. 1993, p.1, capa do Correio Dois.

Espetáculos 25

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Fontes de pesquisa 16

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  • A montagem inovadora de Ivan e os Cachorros. Cena Contemporânea. Festival Internacional de Teatro de Brasília. Disponível em: <http://www.cenacontemporanea.com.br/2011/?p=1037>. Acesso em: 27 nov. 2011.
  • ESPETÁCULOS Teatrais. [Pesquisa realizada por Júlia do Vale]. Itaú Cultural, São Paulo, [20--]. 1 planilha de fichas técnicas de espetáculos.
  • FERNANDES, Sílvia. Teatros Pós-Dramáticos. In GUINSBURG, J. e FERNANDES, S. (orgs.), O Pós-Dramático. São Paulo: Perspectiva, 2009.
  • FESTIVALCULTURAINGLESA. São Paulo. Disponível em: < http://festival.culturainglesasp.com.br/ivan-e-os-cachorros/231 >. Acesso em : 30 de maio de 2011.
  • FRANCISCO, Severino. João e Maria, história de verdade e mentiras. Correio Braziliense, Brasília, 4 de maio 1985, p. 21.
  • FRANCISCO, Severino. O caso Greta/ Crítica. Correio Braziliense, Brasília, 9 de set. 1987. p.25.
  • GERALDI, Sílvia Maria. O estado de ser e não ser das artes performativas contemporâneas. Revista Científica/FAP, jan./dez. 2008, v. 3, pp. 185-199.
  • GUERRA, Kido. Um fenômeno cultural brasiliense, Correio Braziliense, Brasília, 16 de jun. 1984, p. 19.
  • HOLVIK, Sigurd Ofstad. Rundtur i Helvete. Klasse Kampen, Oslo, Noruega, 09 de nov. 1999, p. 13.
  • Hugo Rodas. Brasilia: Editora ARP, 2010.
  • MAGGIO, Sérgio. Muito Prazer, Fernando Villar. Criador sem fronteiras. Correio Braziliense, Brasília, 28 de ago. 2011, p. 5.
  • MARQUES, Fernando. Um brasileiro na terra de Shakespeare. Correio Braziliense, Brasília, 15 de abr. 1993, p. 1, capa, Correio Dois.
  • QUEIROZ, Fernando Antonio Pinheiro Villar de. Currículo do sistema currículo Lattes. [Brasília], s.d. Disponível em: < http://lattes.cnpq.br/4514248138876111 >. Acesso em: s.d.
  • SALUSTIANO, Mariana. Entrevista de Fernando Villar. Cena Candanga. Disponível em: <http://cenacandanga.blogspot.com.br/search/label/Fernando%20Villar>. Acesso em: abr. 2012.
  • VILLAR, Fernando Pinheiro e CARVALHO, Eliezer Faleiros de (orgs.). Histórias do teatro brasiliense. Brasília: Artes Cênicas - IdA/UnB, Brasília, 2004.
  • VILLAR, Fernando. Fernando Villar. Brasília: [s.n.], 2011. Entrevista concedida a Júlia Júlia Alves Rodrigues Carvalhal.

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