Rodolfo Coelho de Souza
Texto
Rodolfo Coelho de Souza (São Paulo, São Paulo, 1952). Compositor, diretor artístico, musicólogo e professor. Engenheiro civil, formado (1976) pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli/USP), mestre em musicologia (1994) pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP) e doutor em composição musical (2000) pela University of Texas at Austin, com especialização em eletroacústica sob a orientação de Russell Pinkston (1949).
Aos 14 anos, faz suas primeiras composições com violão. Tem aulas com George Oliver Toni (1926), em composição, Cláudio Santoro (1919-1989), em orquestração, e Conrado Silva (1940-2014), em música eletrônica.
Sua produção é diversificada e inclui obras para orquestra sinfônica, conjuntos de câmara, solistas e música eletroacústica. Entre 1984 e 2010, é diretor artístico adjunto de dez edições do Festival Música Nova de Santos e São Paulo e colaborador da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp). Em 1989, faz a curadoria de música para a 20ª Bienal Internacional de São Paulo. Em 1988, 1989 e 1993 dirige o Simpósio de Música Contemporânea do Festival de Inverno de Campos do Jordão. Recebe, em 1990, a Bolsa Vitae de Composição para a elaboração da obra Tristes Trópicos que, no ano seguinte, apresenta em turnê por universidades nos Estados Unidos e no Canadá, em versão para computador e sintetizadores. Em 1992, representa o Brasil no Sound Celebration II, Estados Unidos. Em 1996, participa do Festival Sonidos de las Américas, no Carnegie Hall de Nova York, apresentando a primeira audição da obra Chiaroscuro. Em 1994 e 1998, é membro do júri do Grawemeyer Award, em Louisville, concurso internacional de composição dos Estados unidos, apresentando seu Concerto para Computador e Orquestra (2000), considerado o primeiro do gênero.
De 2000 a 2005 é professor do Departamento de Artes da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e, em seguida, torna-se professor do Departamento de Música da Faculdade de Filosofia Ciência e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FFCLRP/USP). Em 2009, retorna aos Estados Unidos onde realiza pesquisa de pós-doutorado na University of Texas. É também vice-presidente das Américas na International Computer Music Association. Recebe diversos prêmios, entre os quais o de finalista do Seamus Award de 1998, pela obra O que Acontece Embaixo da Cama Enquanto Janis Está Dormindo?, e o Prêmio Lei Sarney de compositor revelação de 1988 pela obra Galáxias, para piano e orquestra. Entre suas composições musicais destacam-se: O Livro dos Sons (2010) para orquestra e sons eletrônicos, Concerto para Computador e Orquestra (2000) e Tristes Trópicos (1991).
Análise
A produção de Coelho de Souza destaca-se pelas composições que utilizam sons eletrônicos, combinados com instrumentos acústicos. Na primeira obra que cria nesse gênero, Durações (1976), estreada pela Camerata Benda, utiliza sons gerados por um sintetizador analógico. A primeira fase de sua produção (1968 a 1970) é embasada em princípios aprendidos com George Oliver Toni (1926). Segundo o mestre, é preciso partir de um material restrito, e dele derivar a composição. Surge a economia construtivista, pela qual “a forma [...] revela-se como necessidade, expandindo-se do material e que preconiza o desenrolar da estética estruturalista de sua obra”, nas palavras da pesquisadora Tatiana Catanzaro1.
O maestro Lutero Rodrigues2, membro da Academia Brasileira de Música, afirma que Coelho de Sousa reconhece três fases distintas em sua produção musical: a serialista, que se desenvolve do início até 1982, na qual predomina a utilização da técnica dodecafônica e do serialismo; a minimalista, no período de sua permanência nos Estados Unidos e a experimentação, com procedimentos característicos desta corrente estética, até 1996.
Nos seminários de música Pro-Arte, liderados pelo compositor e professor Hans Joachim Koellreutter (1915-2005), em 1970, no Rio de Janeiro, entra em contato com a técnica serialista. O automatismo dessa técnica intriga-o e questiona-se sobre sua relação com a audição. Segundo o compositor, “compor é organizar os sons a partir de relações que estão implícitas no material”, e apesar de estruturalista, sua música raramente deixa transparecer processos automatistas: “a música tem de se realizar como expressão de si mesma, e não como automatismo musical.”
Nas obras compostas nas décadas de 1980 e começo de 1990, desenvolve um estilo minimalista que utiliza sintetizadores comerciais controlados por MIDI3. Na década de 1990 passa a trabalhar com síntese digital em Csound4 e a manipulação de material pré-gravado, reunindo elementos da música concreta e técnicas eletroacústicas. Além disso, mantém orquestra sinfônica em suas composições, pouco frequente no repertório eletroacústico brasileiro.
No período em Austin, conforme João Marcos Coelho5,o compositor recebe novas influências, como a de Philip Glass (1937) e renova sua linguagem. Busca inspiração nas obras de seu período inicial, mas combinando-as, como afirma: “com pesquisas em música eletroacústica para as quais me movimentava naquele momento [...] Por outro lado, também não cedi à sedução da linguagem pseudo-moderna que se pratica nas instituições acadêmicas americanas, uma linguagem neo-clássica baseada em modalismos confortavelmente previsíveis e atonalismos estéreis, desprovidos da poética instigante que gerou o serialismo na sua origem.”
A participação, em 1994 e 1998, como membro do júri do Grawemayer Award, em Louisville, Estados Unidos, revela a importância da contribuição de sua obra, mesmo para ele: “mal podia acreditar que pelas minhas mãos passavam obras de alguns dos mais famosos compositores contemporâneos do mundo todo – Luciano Berio (1925-2003), Wolfgang Rihm (1952) , Elliot Carter (1908-2012), Philip Glass (1937), Steve Reich, Toru Takemitsu, Tam Dum, John Admas, Louis Andriessen, Henryk Gorécki, Mauríco Kagel, apenas para mencionar alguns. Creio que esta foi uma das mais gratificantes experiências musicais de toda minha vida.”
Na terceira fase de seu trabalho, considera-se liberto de influências anteriores, porém, mantem um vínculo por meio da intertextualidade. Esta intertextualidade, conceito oriundo da literatura, aliada com a coerência formal dos procedimentos matemáticos, tais como teoria dos conjuntos e combinatórias de intervalos, caracterizam sua obra da terceira fase. O vínculo com a matemática está relacionado à formação como engenheiro. “Para ele, […] o motivo funciona como um tijolo icônico com o qual podem ser construídas as figurações mais importantes de uma peça”6.
Rodolfo Coelho de Souza é influenciado pelas ideias do compositor Willy Corrêa de Oliveira (1938), reunidas no livro Beethoven, Proprietário de um Cérebro (1979), e pelos fundamentos da semiótica musical. O contato com esta última vem do curso Semiótica da Música, ministrado em1987, por Lucia Santaella (1944). Nasce daí sua poética composicional, cujo exemplo maior é o poema sinfônico para piano e orquestra Galáxias (1986), baseado na obra homônima do poeta Haroldo de Campos (1929-2003). A relação entre obras, como com a de Gilberto Mendes (1922-2016), pode ser compreendida como tradução intersemiótica entre matrizes musicais construtivas e estruturais. Com isso, aprimora o que estava presente em outras áreas de criação, como em Da experiência do pensar (1972) sobre poemas do filósofo alemão Martin Heidegger (1889-1976).
Em síntese, ainda segundo João Marcos Celho, “o mais admirável em Rodolfo Coelho de Sousa, é que a necessidade de criar música flui através dele (segundo expressão de Debussy), como se ele fosse apenas um instrumento para que ela se manifeste”. Neste sentido ele pertence a uma ilustre linhagem compartilhada com seus mestres Claudio Santoro, Gilberto Mendes e Oliver Toni.
Notas
1. CATANZARO, Tatiana. Notas Biográficas dispersas. In: COELHO, Francisco Carlos. Cadernos de Música Contemporânea Brasileira: Rodolfo Coelho de Souza. Imprenta: São Paulo (SP) : Centro Cultural São Paulo. Discoteca Oneyda Alvarenga, 2006.
2. RODRIGUES, Lutero. A música de Rodolfo Coelho de Souza. In: COELHO, Francisco Carlos. Cadernos de Música Contemporânea Brasileira: Rodolfo Coelho de Souza. Imprenta: São Paulo (SP) : Centro Cultural São Paulo. Discoteca Oneyda Alvarenga, 2006.
3. MIDI (Musical Instrument Digital Interface) – Sigla criada nos anos 1980, por fabricantes de sintetizadores japoneses e norte-americanos, com o intuito de padronizar a linguagem musical utilizada na conexão e transferências de dados entre instrumentos musicais e computadores.
4. Csound é um desdobramento da linguagem de programação C, voltado para sons.
5. COELHO, João Marcos. O Compositor pelo escritor. In: COELHO, Francisco Carlos. Cadernos de Música Contemporânea Brasileira: Rodolfo Coelho de Souza. Imprenta: São Paulo (SP) : Centro Cultural São Paulo. Discoteca Oneyda Alvarenga, 2006.
6. COELHO, Francisco Carlos. Cadernos de Música Contemporânea Brasileira: Rodolfo Coelho de Souza. Imprenta: São Paulo (SP) : Centro Cultural São Paulo. Discoteca Oneyda Alvarenga, 2006. p. 43
Links relacionados 1
Fontes de pesquisa 5
- CATANZARO, Tatiana. Notas Biográficas dispersas. In: COELHO, Francisco Carlos. Cadernos de Música Contemporânea Brasileira: Rodolfo Coelho de Souza. Imprenta: São Paulo (SP): Centro Cultural São paulo. Discoteca Oneyda Alvarenga, 2006.
- COELHO, João Marcos. O Compositor pelo Escritor. In: COELHO, Francisco Carlos. Cadernos de Música Contemporânea Brasileira: Rodolfo Coelho de Souza. Imprenta: São Paulo (SP) : Centro Cultural São Paulo. Discoteca Oneyda Alvarenga, 2006.
- FESTIVAL Música Nova. Site do departamento de música da Faculdade de Filosofia Ciência e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FFCLRP/USP). Disponível em: http://www.ffclrp.usp.br/musica/47_fmn.html. Acesso em: 11 set. 2014.
- OLIVEIRA, Willy Corrêa de. Beethoven, proprietário de um cérebro. São Paulo: Perspectiva, 1979. (Signos Música, 2.).
- RODRIGUES, Lutero. A música de Rodolfo Coelho de Souza. In: COELHO, Francisco Carlos. Cadernos de Música Contemporânea Brasileira: Rodolfo Coelho de Souza. Imprenta: São Paulo (SP) : Centro Cultural São Paulo. Discoteca Oneyda Alvarenga, 2006.
Como citar
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RODOLFO Coelho de Souza.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa289914/rodolfo-coelho-de-souza. Acesso em: 05 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7