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Enciclopédia Itaú Cultural
Literatura

Cruz e Sousa

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 14.01.2021
24.11.1861 Brasil / Santa Catarina / Florianópolis
19.03.1898 Brasil / Minas Gerais / Barbacena
Coleção Brasiliana Itaú / Reprodução Fotográfica Horst Merkel

Broqueis, 1893
Cruz e Sousa

João da Cruz e Sousa (Nossa Senhora do Desterro, atual Florianópolis, Santa Catarina, 1861 – Barbacena, Minas Gerais, 1898). Poeta e jornalista. Reconhecido como o maior simbolista brasileiro, é o primeiro autor negro, filho de escravos libertos, a entrar para o cânone da literatura brasileira.

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João da Cruz e Sousa (Nossa Senhora do Desterro, atual Florianópolis, Santa Catarina, 1861 – Barbacena, Minas Gerais, 1898). Poeta e jornalista. Reconhecido como o maior simbolista brasileiro, é o primeiro autor negro, filho de escravos libertos, a entrar para o cânone da literatura brasileira.

O acento inicial de sua atuação pública é o abolicionismo, sobretudo em publicações como o jornal Colombo, que funda em 1881, Tribuna Catarinense, com que colabora, e O Moleque, do qual se torna diretor no ano da estreia literária, e também em conferências ministradas em diferentes cidades brasileiras até 1888. O tema está presente em seu livro de estreia Tropos e Fantasias (1885), coletânea publicada em parceria com o contista e romancista Virgílio Várzea (1863-1941). A obra revela interesses que se mantêm nos livros seguintes, como a busca da palavra rara, a importância conferida à música e o experimentalismo em prosa.

A publicação das obras Broquéis e Missal, ambas de 1893 e consideradas marco inicial do Simbolismo no Brasil, é saudada apenas por um pequeno grupo próximo, ao qual pertence Nestor Victor (1868-1932), principal responsável pela divulgação da obra após a morte do poeta. Missal reúne 45 poemas em prosa, revelando uma de suas principais influências, o poeta francês Charles Baudelaire (1821-1867), criador do gênero. Em Broquéis há claro predomínio do soneto e da busca pelo estilo elevado. Aspectos tipicamente simbolistas – como os estados imprecisos de alma, a busca de uma linguagem poética capaz de transcender a razão e o uso de recursos como a sugestão e a musicalidade – não aparecem de forma pura nas obras. Ora se associam a traços parnasianos, como o esteticismo, o preciosismo sintático e lexical e a predileção pelo soneto, ora contrastam com forte sensualismo. A realidade não é representada, mas convocada por meio de deformações promovidas pelo olhar do sujeito.

Entre críticos e estudiosos da obra de Cruz e Souza, a recorrente presença da cor branca e de imagens da noite tornam-se objeto de debate e geram diferentes interpretações. Por um lado, o francês Roger Bastide (1898-1974) cria uma leitura cujas consequências são posteriormente questionadas. Nela, o primeiro traço é compreendido como a tradução poética da “nostalgia do branco”, experimentada, segundo o crítico, pelo poeta – isto é, o desejo de se tornar ariano, de “mudar mentalmente de cor”. Segundo o crítico, esse desejo de ascensão social explica a adesão ao simbolismo, “poesia essencialmente nórdica”, distante da realidade brasileira1. Já as também frequentes imagens da noite são, para Bastide, a marca pessoal de Cruz e Souza no quadro simbolista. Por outro lado, David Arrigucci Jr. (1943) retoma o argumento de que a noite seja mediação para a transcendência, mas aponta o “reducionismo sociológico” que não permite a Bastide “demonstrar a pertinência estética do social para a compreensão da estrutura poética”2. Para Massaud Moisés (1928-2018), a predileção por imagens do branco responde à convenção simbolista. Já Ivone Daré Rabello mostra como elementos fundamentais da lírica de Cruz e Sousa, tais como o visionarismo, a alucinação, os espaços sublimes e os mundos demoníacos, são “respostas líricas do excluído”, isto é, elementos poéticos que dão forma aos dilemas pessoais, de fundo histórico-social, vividos pelo autor numa sociedade escravocrata que jamais o aceita em seu círculo intelectual3.

Temas como a pobreza, o preconceito e a proximidade da morte se fazem presentes ainda nos livros póstumos – dois deles escritos em boa parte durante o adoecimento de Gavita. “Emparedado”, poema em prosa de Evocações (1898), dá forma às dificuldades do poeta “em completa, lógica e inevitável revolta” contra o meio. Os poemas de Faróis (1900), considerados o melhor de sua produção, são povoados de aspectos tipicamente simbolistas, como as imagens gélidas e cadavéricas, a amada morta e apodrecida e a exploração sonora dos signos – que ocorre, por exemplo, no poema “Violões que choram”, um de seus mais conhecidos: “[...] Vozes veladas, veludosas vozes, / Volúpias dos violões, vozes veladas [...]”. Em Últimos Sonetos (1905), as imagens deixam de ser obscuras, a sintaxe se simplifica e o destino trágico do artista aparece como sofrimento interiorizado, como em “O Assinalado”. Esse conjunto de características torna o livro de mais fácil aceitação junto ao público.

Embora não haja consenso entre as interpretações da obra do poeta, as leituras críticas apontam de forma unânime a qualidade de sua produção e o fato de ter sido o introdutor do simbolismo no país. Para alguns autores, Cruz e Sousa é o maior poeta brasileiro do século XIX.

Notas
1. BASTIDE, Roger. Quatro estudos sobre Cruz e Souza. In: Poesia afro-brasileira. São Paulo: Martins, 1943, p. 87, 90.
2. ARRIGUCCI JR., Davi. A noite de Cruz e Sousa. In: ARRIGUCCI JR., Davi. Outros achados e perdidos. São Paulo: Companhia das Letras, 1999, p. 167.
3. RABELLO, Ivone Daré. Um canto à margem: uma leitura da poética de Cruz e Sousa. São Paulo: Nankin: Edusp, 2006, p. 21.

Obras 79

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Exposições 1

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Fontes de pesquisa 11

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  • BASTIDE, Roger. Quatro estudos sobre Cruz e Souza. In: Poesia Afro-brasileira. São Paulo: Martins, 1943.
  • BRAYNER, Sônia. Cruz e Sousa: Missal e Evocações. Labirinto do espaço romanesco. In: Tradição e renovação da literatura brasileira: 1880-1920. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, Brasília: INL, 1979.
  • BROOKSHAW, David. Raça e cor na literatura brasileira. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1983.
  • COUTINHO, Afrânio. Cruz e Sousa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília, INL, 1979 (Col. Fortuna Crítica, v. 4).
  • GONÇALVES, Aguinaldo José (org.). Cruz e Sousa (Seleção de textos, notas, estudos biográficos, históricos e críticos e exercícios). São Paulo: Abril Educação, 1982.
  • LEMINSKI, Paulo. Cruz e Sousa, o negro branco. São Paulo: Brasiliense, 1983.
  • MAGALHÃES Jr. Raimundo. Poesia e Vida de Cruz e Sousa. 3.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília, INL, 1975.
  • MONTENEGRO, Abelardo F. Cruz e Sousa e o movimento simbolista. 2.ed. Florianópolis: FFC Edições, 1988, 216p.
  • MURICY, José Cândido de Andrade. Para conhecer melhor Cruz e Sousa. Rio de Janeiro: Bloch Editores, 1973.
  • OLIVEIRA, Franklin de. Os Simbolistas. Literatura e Civilização. DIFEL/MEC, 1978.
  • SAYERS, Raymond. O poeta negro no Brasil: O caso de João Cruz e Sousa. Onze Estudos de Literatura Brasileira. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.

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