Mônica Salmaso
Texto
Biografia
Mônica Salmaso Pinheiro (São Paulo, São Paulo, 1971). Cantora. O gosto pela música surge na infância, ao acompanhar, com a voz afinada, os discos de música popular brasileira (MPB) que escuta em casa. O estudo formal de música, porém, só se inicia bem mais tarde, na época do cursinho pré-vestibular, quando começa a fazer aulas de canto no Espaço Musical,1 em São Paulo. Após alguns meses de aula, desiste do vestibular para jornalismo e decide se tornar cantora.
Em 1989, faz seu primeiro trabalho profissional, cantando na peça O Concílio do Amor, com direção de Gabriel Villela. Apresenta-se em vários bares paulistanos antes de integrar o grupo Notícias dum Brasil, de Eduardo Gudin. O primeiro trabalho fonográfico data de 1993, participa do CD Luz do Cais, de Mário Gil, na canção Cidadela, de Nivaldo Ornellas e Jairo Lara. Interpreta três faixas do disco Canções de Ninar, 1994, e duas do Canções de Brincar, 1996, projeto da dupla Palavra Cantada, formada por Paulo Tatit e Sandra Peres. Participa do álbum Eduardo Gudin e Notícias dum Brasil, e de cinco faixas do disco La Navea (A Volta ao Mundo em 19 Melodias), de Inácio Zatz, em 1995. No mesmo ano, em parceria com o violonista Paulo Bellinati, grava todos os afro-sambas de Baden Powell e Vinicius de Moraes, no disco Afro-Sambas. Com esse trabalho, Mônica faz suas primeiras turnês internacionais, na Venezuela, Estados Unidos e Europa.
O segundo disco, Trampolim, 1998 (Pau Brasil), conta com renomados instrumentistas brasileiros, como Naná Vasconcellos, Paulo Bellinati, Toninho Ferragutti, entre outros. No mesmo ano, participa do CD Orquestra Popular de Câmara, do grupo homônimo.2 Vence a segunda edição do Prêmio Visa MPB, em 1999, que lhe rende a gravação do disco Voadeira (Eldorado), premiado pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA). Em 2000, atua na trilha do espetáculo O Corpo, escrita por Arnaldo Antunes para o Grupo Corpo. No ano seguinte, é uma dos finalistas do Festival da Canção da Rede Globo. Entre 2002 e 2003, realiza o projeto Ponto in Comum, recebendo no Serviço Social do Comércio (Sesc) Ipiranga, em São Paulo, convidados especiais para shows únicos. Também leciona canto popular em várias edições do Festival de Música de Curitiba.
Em 2004, lança Iaiá, pela gravadora Biscoito Fino, que produz seus três discos seguintes. Noites de Gala, Sambas na Rua, de 2007, traz apenas composições de Chico Buarque, sendo indicado para o Grammy Latino 2007 como melhor álbum de MPB. Em Nem 1 Ai, gravado em 2000, mas só lançado em 2008, Mônica associa-se a grandes instrumentistas, como André Mehmari, Rodolfo Stroeter, Tutty Moreno, Nailor Proveta e Toninho Ferragutti, para registrar um repertório eclético. Em Alma Lírica, de 2011, acompanhada de Nelson Ayres (piano) e Teco Cardoso (sopros), reúne amostras da música sentimental brasileira, incluindo clássicos como Lábios que Beijei, de J. Cascata e Leonel Azevedo; Derradeira Primavera, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes; e Melodia Sentimental, de Heitor Villa-Lobos e Dora Vasconcellos; além de uma lânguida versão de Trem das Onze, de Adoniran Barbosa.
Faz participação especial em discos de diversos compositores e instrumentistas, como Chico Buarque (Carioca, 2006), Mário Gil (Contos do Mar, 1997, e Comunhão, 2007), a flautista Léa Freire (Cartas Brasileiras) e o violonista Leandro Carvalho (Descobrindo João Pernambuco, 2000). Participa do Songbook - Tom Jobim (1996), Cole Porter & George Gershwin - Canções, Versões (2000), O Mestre Léo Peracchi e a Jazz Sinfônica: Canções de Tom e Vinicius (2001), Um Ser de Luz - Saudação a Clara Nunes (2003), Ode Descontínua e Remota para Flauta e Oboé - de Ariana para Dionísio (obra da poeta Hilda Hilst, musicada por Zeca Baleiro, 2005), Timoneiro (tributo a Hermínio Bello de Carvalho, 2005), Vinicius (trilha do documentário de Miguel Farias Jr., 2005) e Vinicius e os Maestros (2011), de Mario Adnet.
Análise
Com sua voz grave, de timbre aveludado, e grande domínio técnico, Mônica Salmaso é uma das intérpretes mais representativas da música brasileira atual. Integra uma geração de cantoras surgida na última década do século XX, que se vale da proliferação de pequenas gravadoras, nos anos 1990, para divulgar seu trabalho no chamado "mercado de segmento", recém-surgido no Brasil. Com pouquíssima exposição na grande mídia, conquista um público fiel e produz um trabalho que vai para muito além da fonografia, atuando como convidada em shows de diversos artistas e montando repertórios que não chegam a ser gravados, como os das turnês realizadas, respectivamente, com o acordeonista Toninho Ferragutti, o quinteto de clarinetas Sujeito a Guincho e o pianista André Mehmari.
Utilizando a voz como um instrumento que atua em conjunto com os demais, e não à frente deles, a cantora paulistana produz uma obra marcada pelo equilíbrio de sonoridades. O caráter instrumental de seu canto é mais perceptível no trabalho que realiza com a Orquestra Popular de Câmara, em que utiliza vocalizações para solar ou acompanhar os demais instrumentos do grupo. A despeito disso ela participa do disco de Marco Mattoli, do Clube do Balanço, Balanço Bom É Coisa Rara, 1997.
Do mesmo modo, em Espiral - obra de Léa Freire gravada no quinto CD da cantora, Cartas Brasileiras -, sua voz se une ao piano de André Mehmari num duo instrumental harmonioso. Esse equilíbrio entre voz e outros instrumentos se nota também nas canções. É o caso, por exemplo, de Cidade Lagoa, samba de Sebastião Fonseca e Cícero Nunes registrado no álbum Iaiá com o quinteto Sujeito a Guincho. Nessa gravação, a voz se mistura de maneira orgânica aos instrumentos de sopro, num verdadeiro sexteto. Há pouca oralidade no canto de Mônica - que, nesse sentido, pode ser considerada a antítese de outra destacada cantora paulistana, Ná Ozzetti. A comparação das versões que cada uma delas cria para Canto em Qualquer Canto (parceria de Ná Ozzetti com Itamar Assumpção), registradas respectivamente nos discos Estopim, 1999 (Ná Ozzetti) e Voadeira, 1999 (Mônica Salmaso), evidencia a distância entre o canto oralizado da primeira e a voz instrumental da segunda.
Se o canto de Mônica, marcado por uma expressividade contida, carece às vezes da brejeirice, graça ou malícia que exigem certas composições, tal característica é compensada pela riqueza dos arranjos que complementam sua interpretação. Em Menina Amanhã de Manhã, de Tom Zé, gravada no álbum Iaiá, o tom gracioso da canção - que na versão original aparece no modo singelo com que Tom Zé a interpreta - é criado pelo arranjo de Benjamim Taubkin. A paisagem sonora desenhada pelos instrumentos, que vão se sobrepondo um a um até formar uma massa sonora cheia de referências a gêneros populares brasileiros, encerrando-se com as sonoridades de uma banda de circo do interior, confere dinamismo à gravação, atribuindo-lhe certa dramaticidade que talvez não fosse alcançada apenas pelo canto.
Outro aspecto que marca a trajetória da cantora é a escolha do repertório, que abrange um amplo espectro da música brasileira. Tal característica pode ser notada desde Trampolim, que reúne grandes nomes da música popular brasileira (MPB), como Dorival Caymmi (O Bem do Mar) ou Chico Buarque e Edu Lobo (A Permuta dos Santos), temas de domínio público (a exemplo de Canto dos Escravos e Bate Canela), ou ainda temas recolhidos por Mestre Virgínia (Ó Minha Gente e Determinei) e composições de autores contemporâneos, como José Miguel Wisnik e Ronaldo Bastos (Trampolim), Guinga e Paulo César Pinheiro (Saci), e Lenine (Tuaregue e Nagô). O ecletismo se repete nos discos seguintes. Em Nem 1 Ai, por exemplo, a cantora reúne Guinga e Aldir Blanc (Esconjuros), Monsueto Menezes e Arnaldo Passos (Mora na Filosofia), J. Cascata (Minha Palhoça) e Heitor Villa-Lobos (Cair da Tarde, sobre poema de Dora Vasconcelos). Mônica também procura resgatar composições brasileiras pouco visitadas, como Tajapanema, de Waldemar Henrique e Antônio Tavernard, gravada em Trampolim; a já citada Cidade Lagoa e a sertaneja Vingança, de Francisco Mattoso e José Maria de Abreu, ambas registradas em Iaiá.
A escolha criteriosa dos músicos que a acompanham é outra característica de seu trabalho. Cercada de grandes instrumentistas, como os integrantes do grupo Pau Brasil (formado pelo violonista Paulo Bellinati, o pianista Nelson Ayres, o flautista e saxofonista Teco Cardoso, o baixista Rodolfo Stroeter e o percussionista Ricardo Mosca), o quinteto Sujeito a Guincho, Toninho Ferragutti e André Mehmari, a cantora produz um trabalho sofisticado. O apuro técnico e estético de seu trabalho a leva a ser convidada duas vezes para cantar com a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp), ao lado da Banda Mantiqueira, em 2006, e num concerto lançado em disco e DVD em 2008, com o grupo Pau Brasil, em 2008.
Enxergando a música antes como ofício do que como um dom, Mônica afirma sentir-se mais próxima de um padeiro do que de uma diva.3 Avessa à aura de glamour que costuma cercar os cantores no Brasil, promovendo a separação entre artista e público, a cantora prefere o reconhecimento conquistado nos espaços paralelos à fama construída pelos grandes meios de comunicação.
Notas
1 Escola de Ricardo Breim, integrante do extinto Grupo Rumo.
2 A Orquestra Popular de Câmara, um dos projetos da gravadora e produtora Núcleo Contemporâneo, é idealizada pelo pianista Benjamim Taubkin e, em suas várias formações, reúne destacados instrumentistas brasileiros, como o acordeonista Toninho Ferragutti, o violeiro Paulo Freire, o flautista e saxofonista Teco Cardoso, os percussionistas Ari Collares e Caíto Marcondes, entre outros.
3 SALMASO, Mônica. Entrevista ao site Gafieiras. São Paulo, 2003. Disponível em: < http://www.gafieiras.com.br >. Acesso em: 30 out. 2011.
Obras 48
Espetáculos 3
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25/8/2006 - 27/8/2006
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6/12/2011 - 6/12/2011
Links relacionados 1
Fontes de pesquisa 6
- ESPETÁCULOS Teatrais. [Pesquisa realizada por Edélcio Mostaço]. Itaú Cultural, São Paulo, [20--]. 1 planilha de fichas técnicas de espetáculos. Não Catalogado
- NUNES, Henrique. "Cantos do interior". Entrevista com Mônica Salmaso. Diário do Nordeste, 13 de abril de 2004, Caderno 3.
- SALMASO, Mônica. Entrevista a John Neschling, realizada em dezembro de 2004. Disponível em: <http://podcast.osesp.art.br/wp/podpress_trac/web/69/0/osesp_15_john_neschiling_monica_salmaso.mp3>. Acesso em: 03 nov. 2001.
- SALMASO, Mônica. Entrevista ao site Gafieiras. São Paulo, 2003. Disponível em: . Acesso em: 30 out. 2011.
- SALMASO, Mônica. Entrevista ao site Gafieiras. São Paulo, 2003. Disponível em: . Acesso em: 30 out. 2011.
- SALMASO, Mônica. Site oficial da artista. Disponível em: <www.monicasalmaso.mus.br>. Acesso em: 03 nov. 2011.
Como citar
Para citar a Enciclopédia Itaú Cultural como fonte de sua pesquisa utilize o modelo abaixo:
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MÔNICA Salmaso.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa200397/monica-salmaso. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7