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Enciclopédia Itaú Cultural
Teatro

Sandro Borelli

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 05.11.2024
11.11.1959 Brasil / São Paulo / Santo André
Sandro Borelli (Santo André, São Paulo, 1959). Coreógrafo, bailarino. Reconhecido por seu trabalho autoral de investigação do movimento, que alia bases literárias, elementos de teatralidade e a expressão estética da resistência política e da contestação social, resultando em criações de dança contemporânea que enfrentam as violências do nosso te...

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Sandro Borelli (Santo André, São Paulo, 1959). Coreógrafo, bailarino. Reconhecido por seu trabalho autoral de investigação do movimento, que alia bases literárias, elementos de teatralidade e a expressão estética da resistência política e da contestação social, resultando em criações de dança contemporânea que enfrentam as violências do nosso tempo.

Cresce em meio a um ambiente conservador e frequenta o serviço militar, que abandona para se tornar bailarino. Aproxima-se da arte fazendo cursos de teatro. Logo constata o desejo por envolver mais o corpo na ação e opta pela dança como linguagem expressiva. Cursa licenciatura e bacharelado em educação física na Universidade Nove de Julho, em São Paulo.

Em 1982, é admitido como bailarino no Ballet Guaíra, de Curitiba. Em seguida, torna-se um dos principais solistas do Balé da Cidade de São Paulo, antes de se lançar como coreógrafo independente no início da década de 1990. Em 1996, vai à Carolina do Norte, Estados Unidos, para uma residência artística no American Dance Festival e, no ano seguinte, cria a companhia de dança FAR-15, rebatizada em 2004 de Cia. Borelli de Dança, e, posteriormente, de Cia. Carne Agonizante.

Suas coreografias encontram mote nas obras de escritores como Augusto dos Anjos (1884-1914), Cruz e Souza (1861-1898), Fiódor Dostoievski (1921-1981) e, principalmente, Franz Kafka (1883-1924), explorando questões relativas ao sofrimento humano sob uma perspectiva crítica às relações de poder e às formas de opressão.

A Metamorfose (2002) parte da novela homônima para composição de uma dramaturgia corporal em que o isolamento e a culpa presentes na obra literária são investigados no corpo em conflito, sujeito à violência de ser pisoteado e derrubado e à autoflagelação. O desconforto atinge os movimentos dos bailarinos, que são lineares, monocórdicos e dilatados; sua relação com o público; a trilha sonora ruidosa; e os demais elementos da cena. “A luz é pouca, mas não escura. A movimentação é árida, mas não é pouca; o figurino é frio, mas sufoca. A atmos­fera é densa, como em um anoitecer em pleno inverno tcheco”1.

O mesmo autor fornece as bases dramáticas para outras coreografias, entre elas Carta ao Pai (2006), em que disseca conteúdos emocionais de ações e gestos, como o olhar; e Kafka in off (2007), que completa o tríptico. Neste, os corpos aparecem vergados e sem escapatória, as cenas se encadeiam sem uma transição harmoniosa entre elas, reforçando a atmosfera atormentada. Além disso, Borelli reúne e reconfigura trechos coreográficos preexistentes, como Inside, criada em 1996 para o Balé da Cidade de São Paulo.

Esse retorno a um trabalho da década anterior evidencia “o ambiente kafkiano de Borelli”2, marcado pela solidão e pela impotência do mundo sombrio da burocracia, mesmo em coreografias que não compõem o ciclo Kafka. Para a crítica de dança Helena Katz, Kafka in off refina as metáforas com as quais o coreógrafo compõe um universo kafkiano, sinal de maturidade do artista.

Em seu processo de composição de espetáculos, Borelli valoriza artistas sem treinamento prévio em técnicas de dança pela originalidade da movimentação destes, adequada a seu interesse em colocar em cena corpos laicos, anárquicos e guerrilheiros, nem mecanizados nem domesticados. Uma vez na companhia, a intensa preparação corporal dos bailarinos visa a obter força e flexibilidade para concretizarem as proposições estéticas. “É um corpo predisposto à ação que se constrói de forma organizada.”3

Questões urgentes para a vida social motivam a prolífica produção de Borelli ao longo das décadas. Carne Santa (2007) baseia-se na vida e obra do cantor e compositor Renato Russo (1960-1996), abordando as relações sociais nos anos 1980 sob impacto do vírus da aids. Em Estado Independente (2009), o legado político de Che Guevara (1928-1967) é tomado como possibilidade de luta contra a miséria social, apresentando um corpo guerrilheiro, resistente, disciplinado e em mobilização coletiva.

Com a Cia. Carne Agonizante, Borelli retorna a Kafka em 2013 e transpõe o absurdo da obra Colônia Penal (1914) para o contexto da ditadura militar brasileira (1964-1985)4, detalhando métodos de tortura em regimes antidemocráticos. Em uma dramaturgia corporal teatralizada, coloca em cena cinco personagens anônimos, representantes das instituições de poder, que fazem duetos bárbaros com a figura da torturada (a bailarina Patrícia Pina). Em 2020, o espetáculo ganha versão audiovisual.

A remontagem de coreografias faz parte das preocupações do diretor como valorização da história da companhia e da dança. Para além do palco, em 2010 Borelli idealiza a Murro em Ponta de Faca, revista de arte, cultura e dança, em versões impressa e on-line, com propósito de fomentar a reflexão coletiva sobre a dança e seus aspectos socioeconômicos.

Com habilidade para transformar indignação em motor criativo, Sandro Borelli elabora uma linguagem autoral amplamente premiada e um repertório sem concessões, comprometido estética, ética e politicamente, que circula por festivais brasileiros e internacionais e traça novos caminhos para a cena de dança contemporânea do país.

Notas

1. DORIA, Gisela. Sandro Borelli e a dramaturgia da violência. Conceição| Conception, Unicamp, v. 2, n. 1, p. 33-40, 2013. 

2. KATZ, Helena. Sandro Borelli, escrita coreográfica de sólida coerência. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 27 nov. 2006.

3. FIGUEIREDO, Valeska Marlete Guimarães et al. Trajetórias desviantes - implicações estéticas e políticas na dança da Cia Borelli e do Núcleo Artístico Vera Sala. 2012. 

4. Também denominada de ditadura civil-militar por parte da historiografia com o objetivo de enfatizar a participação e apoio de setores da sociedade civil, como o empresariado e parte da imprensa, no golpe de 1964 e no regime que se instaura até o ano de 1985.

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