João Denys
Texto
Biografia
João Denys de Araújo Leite (Currais Novos RN 1957). Autor, diretor, cenógrafo, figurinista, maquiador, iluminador, sonoplasta, programador visual, ator, professor e ensaísta. Seu trabalho se caracteriza por certo conceptismo estético atualizado, pelo diálogo com outros textos e pelo apuro formal. Parte significativa de seus ensaios e de sua dramaturgia está voltada para o imaginário nordestino, em viés universalizante.
Em 1975, passa a residir no Recife, para dar continuidade aos estudos. Frequenta o Curso Regular de Teatro - Formação do Ator, no Teatro Hermilo Borba Filho (THBF), em Olinda, Pernambuco, entre 1977 e 1979. É o ano em que começa a participar do Grupo de Teatro Hermilo Borba Filho (GTHBF), dirigido por Marcus Siqueira. Nesse grupo entra em contato com o ator, encenador e professor Luiz Maurício Carvalheira, que, juntamente com Marcus Siqueira, impulsiona sua carreira teatral.
No GTHBF, João Denys encontra espaço, em dezembro de 1977, para encenar Gioconda, de sua autoria, apresentada por Marcus Siqueira como um texto pleno de liberdade, em tempos sombrios.1 Denys conclui o bacharelado em comunicação visual, em 1981, na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Dois anos depois, no espetáculo A Visita de Sua Excelência, de Luiz Francisco Rebello, direção de Carlos Bartolomeu, além de se destacar como o protagonista e ganhar o prêmio de melhor ator, recebe o prêmio especial de melhor cenografia, do júri do 3º Festival de Teatro do Recife.
De 1982 a 1986, é professor da Fundação Centro de Comunicação Social do Nordeste (Fundação Cecosne) e realiza espetáculos de cunho didático com alunos-atores do Curso Regular de Teatro e também com o Grupo Profissional de Teatro de Bonecos (Teatroneco). Como ator e manipulador do espetáculo de teatro de bonecos Bumba!!! Meu Boi Dá Vida!, criação coletiva do Teatroneco/Cecosne, apresenta-se em Córdoba, Bilbao, Sevilha, Zaragoza e Madri, na Espanha, pela União Internacional de Marionetistas/Unima Internacional, em dezembro de 1983.
Na montagem de A Mais Forte, o encenador Carlos Bartolomeu duplica o curto texto de August Strindberg, organizando-o em dois atos e duas versões: a primeira, mais expressionista, e a segunda, uma releitura do texto pela ótica da commedia dell'arte. O trabalho de João Denys como cenógrafo e figurinista, além de programador visual da montagem, aprofunda o sentido da encenação.
Em Sonho de uma Noite de Verão, de William Shakespeare, direção de Antonio Cadengue, Denys cria um dispositivo cênico que toma quase todo o palco com inúmeros praticáveis que formam um labirinto, e tem na parte central e inferior um túnel em tons verde-azulados; em processo de cocriação com o encenador e com a contribuição do cenógrafo assistente Beto Diniz, faz com que os três planos da peça se iluminem reciprocamente. A maquiagem é criada com inspiração oriental que vai do Nô ao Kathakali, do Kabuki à Ópera de Pequim.
Denys integra o corpo docente da UFPE em 1986, para ministrar as disciplinas de cenografia, maquiagem, indumentária, iluminação, metodologia do teatro, sonoplastia para teatro, história do teatro, interpretação, entre outras.
As encenações com as quais obtém mais repercussão e prêmios originam-se de processos pedagógicos. Em 1992, encena O Círculo da Vida, uma realização da Universidade Popular Dom Hélder Câmara, ligada à Fundação Cecosne, que, entre seus projetos sociais, promove a educação de jovens carentes pela arte. Na montagem do espetáculo, João Denys aplica diferentes métodos de ensino-aprendizagem e estratégias de inclusão social que redimensionam a prática da pedagogia do teatro no Recife. Por meio da capoeira, do gesto, do corpo e do ritual, a peça passa em revista a história dos povos oprimidos, elaborando uma reflexão sobre a colonização do homem latino-americano.
Na encenação, em 1993, de Deus Danado, texto de sua autoria, Denys foge às estetizações da miséria nordestina e traz uma renovação estética para o teatro pernambucano, como comenta a crítica Ivana Moura: "Deus Danado é o vôo criativo de um encenador que domina todos os elementos de sua arte. Para construir o texto ele mergulhou fundo na memória do homem da terra e seu drama seco, matéria primeira com que é feita sua alma. Para contar a história de três criaturas corroídas (Teodoro, Luiz e Roseta - a vaca), ele toca em pontos cruciais do homem nordestino que ganham proporções universalizantes".2
Na montagem didática de Esperando Godot, de Samuel Beckett, em 1996, com alunos do Curso Básico à Formação do Ator, da Fundação Joaquim Nabuco, o encenador conceitualiza o espetáculo com base no cruzamento de diferentes estéticas e linguagens que vão da farsa ao vaudeville, do humor dos Irmãos Marx à tragédia contemporânea, em abordagem ambivalente, mas pertinente à poética beckettiana. O crítico João Luiz Vieira, no balanço teatral de 1996, assim se refere a esse espetáculo: "Sua montagem já nasceu clássica e sua leitura do jogo teatral foi extremamente feliz. Denys distribuiu os personagens como se fossem posições de um jogo e o próprio diretor vestiu a camisa de juiz. No meio de uma cena qualquer, Denys apitava e, imediatamente, novos atores entravam em cena, caracterizados e na mesma intenção dramática do ator que saía".3
João Denys dedica-se ao ensaísmo teatral e à pesquisa acadêmica desde os anos 1990. Seus principais temas de estudo abrangem questões referentes à dramaturgia nordestina, notadamente a de Hermilo Borba Filho, à pedagogia do teatro, ao teatro brasileiro e à estética teatral. Em 2001, obtém o título de mestre em teoria da literatura pela UFPE com pesquisa sobre a dramaturgia de Joaquim Cardozo, publicada em 2003, com o título O Teatro da Morte - Transfiguração Poética do Bumba Meu Boi e Desvelamento Sociocultural na Dramaturgia de Joaquim Cardozo.
Jomard Muniz de Britto, com quem desenvolve vários trabalhos intersemióticos, publicando, entre outros, Arrecife de Desejo (coautoria), em 1994, e Outros Orf'eus (capa, ilustrações e projeto gráfico), em 1995, talvez seja aquele que mais se aproxima de uma visão abrangente de João Denys, mesmo que em um jogo de linguagem: "Sua maestria pairando sobre todos. Sem nos humilhar. Sem perdões. Sem culpas. Tudo, quase tudo na desmedida de um paideuma - ideário de transformação humana - de quem padece e parece já ter lido e reinventado todos os livros, desconstruindo falácias de erudicionismo e reconstruindo todos os saberes de uma antropologia de nós mesmos. Contra nós mesmos".4
Notas
1. SIQUEIRA, Marcus. Gioconda. In: TEATRO HERMILO BORBA FILHO. Gioconda. Direção João Denys. Teatro Hermilo Borba Filho, Olinda, programa, dez. 1977.
2. MOURA, Ivana. Uma pausa para a beleza dura e crua do sertão. Diario de Pernambuco, 31 ago. 1993. Viver, p. D 8.
3. VIEIRA, João Luiz. As melhores cenas do ano de 1996. Jornal do Commercio, Recife, 26 dez. 1996. Caderno C, p. 1
4. BRITTO, Jomard Muniz de. Pulsações renascentistas. In: LEITE, João Denys Araújo. Flores d'América. Recife: Ed. Universitária da UFPE: Sesc Pernambuco, 2005,. p. 123-124.
Espetáculos 172
Exposições 1
Fontes de pesquisa 16
- BRITTO, Jomard Muniz de. Bordel-Brasil Revestido de Noiva. O Galo, Natal, ano 1, nº 11, p. 16-17, jan. 1989.
- BRITTO, Jomard Muniz de. Pulsações Renascentistas. In: LEITE, João Denys Araújo. Flores D'América. Recife: Ed. Universitária da UFPE/ SESC Pernambuco, 2005, p. 119-124.
- ESPETÁCULOS Teatrais. [Pesquisa realizada por Igor Almeida]. Itaú Cultural, São Paulo, [20--]. 1 planilha de fichas técnicas de espetáculos. Não Catalogado
- KÜHNER, Maria Helena. Um Universo Singular. In: LEITE, João Denys Araújo. Flores D'América. Recife: Ed. Universitária da UFPE/ SESC Pernambuco, 2005, p. 13-22.
- LEITE, João Denys de Araújo. Curriculum Vitae. Recife, jun. 2005. 52 p. [Documento digitado].
- LEITE, João Denys de Araújo. Um canto de esperança à América. Diario de Pernambuco, Recife, 9 abr. 1992. Viver, p. D 1. [Entrevista concedida a Ivana Moura].
- MOURA, Ivana. Abismo poético. Diario de Pernambuco, Recife, 9 dez. 1996. Viver, p. C-6.
- MOURA, Ivana. Das Brenhas do Seridó. Diario de Pernambuco, Recife, 19 ago. 1993. Viver, p. D 1.
- MOURA, Ivana. O Teatro dos Meninos Descobre o Mundo. Diario de Pernambuco, Recife, 14 fev. 1993. Viver, p. D 5.
- MOURA, Ivana. Silêncio Aborrecido Deus. Diario de Pernambuco, Recife, 19 ago. 1993. Viver, p. D 1.
- MOURA, Ivana. Um Canto de Esperança à América. Diario de Pernambuco, Recife, 9 abr. 1992. Viver, p. D 1.
- MOURA, Ivana. Um Sonho, um Desejo, uma Mulher: Versos de Del Picchia Embalam uma Velha História de Amor. Diario de Pernambuco, Recife, 23 out. 1990. Viver, p. 1.
- MOURA, Ivana. Uma Espera sem Fim. Diario de Pernambuco, Recife, 30 nov. 1996. Viver, p. D-4.
- MOURA, Ivana. Uma Pausa para a Beleza Dura e Crua do Sertão. Diario de Pernambuco, 31 ago. 1993. Viver, p. D 8.
- SIQUEIRA, Marcus. Gioconda. In: TEATRO HERMILO BORBA FILHO. Gioconda. Direção João Denys. Teatro Hermilo Borba Filho, Olinda, programa, dez. 1977.
- VIEIRA, João Luiz. As Melhores Cenas do Ano de 1996. Jornal do Commercio, Recife, 26 dez. 1996. Caderno C, p.1.
Como citar
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JOÃO Denys.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa109323/joao-denys. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7