Companhia de Teatro da UFBA
Texto
O registro oficial do nome Companhia de Teatro da UFBA só aparece em programas de espetáculos a partir da montagem de Ciranda, sob a direção de Ewald Hackler (1935) e Harildo Déda (1939), em outubro de 1984. Porém, em todo material institucional de divulgação produzido posteriormente existe um consenso da Escola de Teatro da UFBA em considerar, como data de fundação desse grupo de pesquisa e criação de espetáculos, a estreia, em 1981, no Teatro Santo Antônio (atual Teatro Martim Gonçalves) da peça Seis Personagens à Procura de um Autor, do dramaturgo italiano Luigi Pirandello (1867-1936), sob a direção de Harildo Déda.
A criação oficial de uma companhia, produzindo de modo contínuo e sistemático, só se torna possível, no âmbito de uma instituição federal de ensino, por algumas condições pré-existentes no perfil daquela unidade acadêmica que remontam à época de sua fundação. Como primeira condição, a Companhia reúne em seu quadro fixo o conjunto de professores da Escola de Teatro, composto por artistas das diversas funções que compõem o fazer teatral: atores, diretores, dramaturgos, cenógrafos, figurinistas, aderecistas, iluminadores e maquiadores. Isso permite ao núcleo que se forma dispor de mão de obra especializada, garantida por profissionais já contratados como docentes e que desenvolvem, nas montagens, suas atividades de pesquisa e produção artística. Ainda em termos de recursos humanos, a unidade conta com atores, cenotécnicos e costureiras, na condição de funcionários do quadro permanente.
A segunda condição é oferecida pelo conjunto de instalações e equipamentos voltados à produção de espetáculos: um teatro de 194 lugares, construído em 1958 e totalmente reequipado, em seus recursos de iluminação e sonorização, por reforma concluída em 2007, um espaço de 70 lugares destinado a montagens de pequeno porte, a Sala 5, além de carpintaria, rouparia, ateliê de costura e sala de maquiagem.
Fundada com o compromisso de difundir um padrão estético e técnico de excelência para as artes cênicas, a Companhia logo se transforma num espaço para a integração de ensino e pesquisa teatral, incorporando, no elenco de cada montagem, ao quadro fixo de docentes, alunos estagiários e artistas convidados. Isso oferece oportunidade para que atores renomados como Carlos Petrovich (1934-2005); Nilda Spencer (1924-2008), Wilson Melo (1933-2010), Haydil Linhares (1935-2010), Yumara Rodrigues (1935), Carlos Nascimento (1953), Jorge Gaspari (1947), Armindo Bião (1950), Hebe Alves (1953), Iami Rebouças (1959), Joana Schnitmann (1957), Gideon Rosa (1953) e Sônia Rangel (1948), entre muitos outros, possam contracenar com intérpretes iniciantes, enriquecendo sua formação com a troca de experiências e o convívio com diferentes estilos de prática cênica. Graças a essa política, a trajetória da Companhia atesta sua decisiva contribuição para revelar novos atores, muitos dos quais, a seguir, em suas trajetórias pessoais, tornam-se artistas de destaque no cenário nacional, no teatro, na TV e no cinema, a exemplo de Vladimir Brichta (1976) e Wagner Moura (1976), que em 1996 compõem, como jovens intérpretes, o elenco de A Casa de Eros, peça de Cleise Mendes (1948) sob a direção de José Possi Neto (1947).
Um exemplo expressivo desse diálogo entre gerações ocorre na montagem da peça O Terceiro Sinal, que em novembro de 2007 é escolhida para reinaugurar o Teatro Martim Gonçalves, reaberto ao público após completa reforma de suas instalações. O texto, especialmente escrito por uma jovem dramaturga baiana, Claudia Barral (1978), a convite do diretor Deolindo Checcucci (1948), trata com humor e delicadeza da relação entre quatro atores veteranos, nos momentos de expectativa que antecedem à entrada em cena. Os quatro personagens são interpretados por Wilson Melo, Mário Gadelha, Haydil Linhares e Sônia Rangel, atores e atrizes com longa e relevante contribuição ao repertório desse coletivo, e através deles a peça ganha o sentido de uma homenagem à própria trajetória da Companhia.
Desde as primeiras realizações, a Companhia divulga, através de catálogos e programas de espetáculos, alguns princípios que orientam suas ações. O primeiro deles diz respeito à realização de montagens de baixo custo e alto valor criativo, buscando produzir espetáculos mais significativos do ponto de vista artístico-cultural do que dos lucros previstos pelo retorno de bilheteria. Essa escolha estética cria condições para a manutenção de um segundo princípio igualmente relevante a nortear a produção cênica: a divulgação de textos inéditos ou pouco conhecidos, identificando tendências emergentes na dramaturgia mundial.
Desde sua primeira década de atividades, a Companhia contribui para divulgar as últimas criações da escrita dramática contemporânea, apresentando, em estreias nacionais, autores até então desconhecidos do público brasileiro, como o polonês Slawomir Mrozek (1930), do qual são encenadas, pelo diretor Ewald Hackler (1935), as peças Em Alto Mar (1985), Tango (1987) e Noite Encantada (1996); o tcheco Pavel Kohut (1928), autor de Pobre Assassino, e o sueco Per Olov Enquist (1934), autor de A Noite das Tríbades, montagens de 1983 e 1985, respectivamente, ambas sob a direção de Harildo Déda.
Dramaturgos brasileiros são igualmente revelados ou difundidos, através de encenações ousadas, como as que realiza o diretor Paulo Dourado (1955) para A Caverna, de Walter Smetak (1913 - 1984) e O Cego, de Gustavo Etkin (1946) ou a montagem irreverente de D. Maria I, a Louca, de Aninha Franco (1950), por Deolindo Checcucci , em 1997.
Em paralelo com a valorização das tendências teatrais contemporâneas, um terceiro princípio apresentado pela Companhia como diretriz de sua atuação compreende a releitura criativa dos clássicos, através de um diálogo crítico com a tradição. Nessa linha inscrevem-se espetáculos que reinterpretam cênicamente textos representativos da história do teatro, vistos de uma perspectiva contemporânea, como A Torre em Concurso, comédia musical de Joaquim Manoel de Macedo (1820 - 1882) encenada por Deolindo Checcucci em 1984, ou a retomada, por Ewald Hackler, de um marco universal da comédia, como Arlequim, Servidor de Dois Patrões, do dramaturgo italiano Carlo Goldoni (1707 - 1793).
Ao combinar concepções cênicas arrojadas e alto nível de elaboração técnica, os espetáculos produzidos pela Companhia conseguem em breve tempo estabelecer um padrão de referência para o teatro local e conquistar reconhecimento de público e crítica. O Troféu Martim Gonçalves (1978-1986), uma promoção da TV Aratu, é conferido a várias categorias, nas montagens realizadas na década de 1980, como Melhor Atriz Coadjuvante para a peça Caixa de Sombras; Melhor Ator Coadjuvante para Pobre Assassino; Melhor Atriz para Ciranda; Melhor Direção e Prêmio Especial para A Caverna; Melhor Direção e Melhor Ator para Em Alto Mar; Prêmio Especial de Intérprete para a atriz Yumara Rodrigues em Dias Felizes; Melhor Cenário e Figurino e Melhor Ator Coadjuvante para Vida de Eduardo II.
Nas décadas seguintes, a Companhia conquista várias premiações locais e nacionais, como Melhor Espetáculo e Melhor Diretor para a peça O Menor Quer Ser Tutor, no V Festival de Teatro de Blumenau - SC, em 1991; o Troféu Bahia Aplaude, de Melhor Espetáculo e Melhor Direção, para Na Selva das Cidades (1995); de Melhor Ator para Noite Encantada (1996); de Melhor Atriz para Mãe Coragem (1998); de Melhor Ator para Angel City (1998), e o Prêmio Braskem de Melhor Espetáculo, Melhor Direção e Melhor Ator para o espetáculo Arte (2004).
Em 2011, a Companhia comemora 30 anos de atividades com a peça Fim de Partida, um clássico do teatro moderno, do dramaturgo irlandês Samuel Beckett (1906 - 1989). A equipe responsável pela montagem reúne o diretor Ewald Hackler e os atores Harildo Deda e Gideon Rosa, três artistas cuja carreira de realizações se confunde com a própria história desse núcleo teatral. O repertório de encenações acumulado nessas três décadas, bem como o registro de sua recepção pelo público e pela crítica, é prova de que a busca de parâmetros de excelência, associada ao diálogo com a tradição e a contemporaneidade, são opções bem-sucedidas na realização desse programa de montagens, projetando a Companhia como um centro de referência artístico-pedagógica para a formação, produção e difusão das artes cênicas no Brasil.
Fontes de pesquisa 4
- COSTA, Eliene Benício Amâncio; CHECCUCCI, Deolindo. Companhia de teatro da Ufba – 26 anos. Salvador: Secretaria de Cultura do Governo da Bahia: Escola de Teatro da Ufba, 2007.
- LEÃO, Raimundo Matos de. Abertura para outra cena: o moderno teatro da Bahia. Salvador: Fundação Gregório de Matos: EDUFBA, 2006.
- Programas de espetáculos da Companhia de Teatro da UFBA, 1981-2011.
- SANTANA, Jussilene. Impressões modernas: teatro e jornalismo na Bahia. Salvador: Vento Leste, 2009.
Como citar
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COMPANHIA de Teatro da UFBA.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/instituicao633839/companhia-de-teatro-da-ufba. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7