Coletivo MAHKU
Texto
Coletivo Mahku (Aldeia Chico Curumim, Alto do Rio Jordão, Acre, 2013). Coletivo de artistas indígenas da etnia Huni Kuin, também conhecidos como Kaxinawá, originário da Aldeia Chico Curumim, no Alto do Rio Jordão, no Acre, pesquisa e recria artisticamente os cantos visionários do nixi pae, a ayahuasca1. O grupo tem como objetivo vender suas obras para aquisição de terras ao redor da aldeia para protegê-las do desmatamento, além de manter vivas suas tradições. Realizados coletivamente, os trabalhos apresentam figuras bidimensionais, com cores vivas e intensas, e as histórias são compostas a partir das experiências com o uso do nixi pae.
O grupo é liderado por Ibã Huni Kuin, cognome de Isaías Sales (1964), pesquisador dos cantos huni meka desde a década de 1980, quando começa a gravá-los e transcrevê-los para preservar a tradição de seu povo. Com seu filho, o artista Bane Huni Kuin (1981), cria o Coletivo Mahku - Movimento de Artistas Huni Kuin, visando fortalecer a tradição e o idioma Huni Kuin por meio da arte.
Os cantos tradicionais huni meka, através do nixi pae, são pintados em telas multicoloridas de grandes dimensões. Para os Huni Kuin, os cantos criam linguagem e, a partir dessa experiência com as plantas que ensinam e provocam mirações (visões causadas pelo uso da ayahuasca), é possível compreender outras visões de mundo e diferentes modos de acessar o conhecimento. Cada imagem colocada na tela refere-se a uma frase do canto, que compreende muitas histórias. A partir dessa comunhão entre o espírito humano com o da floresta, essas obras conectam os seres.
Essas pinturas que reúnem canto, desenho e tradição desses rituais guardam relação intrínseca com as visões provocadas pelo uso da ayahuasca. A expressão “por no sentido”, de Ibã Sales, traduz as produções do coletivo, que buscam exemplificar com desenhos, audiovisual e pinturas a experiência dos rituais com o nixi pae.
Há diferentes cantos xamânicos, alguns para chamar a força, outros para limpar e curar, e também para guiar os participantes do ritual no “caminho da jiboia”. Cada um desses cantos são representados em telas, a exemplo da obra Nai Mãpu Yubekã (“o pombo cantador que vem de longe, lá do céu, já virou jiboia” - canto de chamar a força) (2018). Pintada em tinta acrílica sobre tecido, a obra com desenhos bidimensionais de pessoas, jiboia, árvore, plantas, peixe, representa a comunhão desses elementos e retrata o canto inicial do ritual da ayahuasca.
A jiboia (yube) é marcante e sempre aparece nas representações do grupo. É um ser mítico para a cultura Huni Kuin e entende-se que a planta que provoca as mirações, o cipó, é a jiboia. Esse animal, presente em diversos mitos do povo Huni Kuin, está sempre representado nos trabalhos do coletivo Mahku, pois se entende que essa espécie é a dona mítica do nixi pae, o maior dos xamãs, que tem o poder de viajar entre os mundos. A obra Yube Nawa Ainbu (2014) mostra uma mulher indígena no centro da cena, envolta por uma jiboia que ocupa toda a dimensão da tela; nas extremidades, há outras figuras de mulheres. Essa obra, composta com cores sólidas, como amarelo, verde, vermelho e azul, corroboram a importância daquele animal para a cultura Huni Kuin.
O grupo atua em multimídia e produz telas, murais, filmes, copos, bolsas e desenhos. Participa, entre outras, das exposições coletivas Made by... Feito por brasileiros, na Cidade Matarazzo (2014), antigo Hospital Matarazzo, próximo à Avenida Paulista, em São Paulo. Nessa exposição, o grupo realiza um trabalho com a artista francesa Naziha Mestaoui (1975-2020), composto por uma videoinstalação e desenhos. A obra do coletivo consiste em pinturas de uma grande jiboia vermelha, branca e preta que envolve todas as paredes brancas da sala expositiva. Segundo o grupo, encontramos uma jiboia quando alguma coisa boa vai acontecer, algo vai dar certo; por isso esse animal está sempre representado em suas produções.
O coletivo colabora também com o 35º Panorama da Arte Brasileira (2017) com o grande mural Yube Nawa Aibu, com desenhos de indígenas, uma grande jiboia no rodapé, elementos da floresta e cores vibrantes. A mostra Encontros Ameríndios, realizada no Sesc Vila Mariana (2021), apresenta a arte contemporânea indígena de cinco povos das Américas, entre eles o grupo Mahku, que reforça os diferentes estilos e estética da produção artística de dos povos indígenas. Na exposição, há um vídeo em que os artistas estão pintando coletivamente, uma marca de seus trabalhos: o fazer coletivo é presente e a autoria das obras atribuídas ao grupo.
Em parceria com Amilton Mattos (1976), professor de licenciatura indígena na Universidade Federal do Acre (UFAC), conhecida como Universidade da Floresta, o coletivo realiza filmes sobre o Mahku e sobre as pesquisas dos cantos do nixi pae, tais como O espírito da floresta (2012) e O Sonho do Nixi Pae – O Movimento dos Artistas Huni Kuin (2014). O grupo oferece também oficinas em diferentes espaços culturais, como a Kayatibu – Juventude Indígena Huni Kuin, uma iniciativa dos jovens Huni Kuin que vivem na zona urbana de Jordão, no Acre.
Como os integrantes têm a liberdade de entrar e sair do coletivo sempre que desejarem, o grupo está sempre em movimento e construção. A arte contemporânea indígena representada nas obras do Mahku, para além da tradição do povo Huni Kuin e das histórias obtidas a partir dos cantos do nixi pae, é marcada por uma estética própria, com uso de cores fortes e elementos bidimensionais. Os trabalhos do coletivo traduzem a poética dos cantos huni meka, explorando diferentes formas com desenhos e pinturas em acrílico para representá-los.
Notas
1. A ayahuasca, conhecida como nixi pae pelos Huni Kuin, é a planta que provoca mirações e alterações sensoriais, e é muito utilizada nos rituais deste povo. Os cantos xamânicos do nixi pae, chamados de Huni Meka, são traduzidos em imagens nos trabalhos do coletivo Mahku.
Exposições 12
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15/5/2012 - 21/10/2012
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14/6/2013 - 11/8/2013
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17/2/2017 - 28/5/2017
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26/9/2017 - 17/12/2017
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27/9/2017 - 17/12/2017
Fontes de pesquisa 15
- 35º Panorama da Arte Brasileira: Brasil por multiplicação. São Paulo: Museu de Arte Moderna de São Paulo, 2017. Disponível em: https://mam.org.br/exposicao/35-panorama. Exposição realizada no período de 27 set. a 17 dez. 2017. Acesso em: 24 out. 2021.
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- DINATO, Daniel Revillion. Os caminhos do MAHKU (Movimento dos Artistas Huni Kuin). 2018. Dissertação (Mestrado) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidaded Estadual de Campinas, 2018. Disponível em: https://bv.fapesp.br/pt/dissertacoes-teses/159585/os-caminhos-do-mahku-movimento-dos-artistas-huni-kuin. Acesso em: 24 out. 2021.
- FERRAZ, Marcos Grinspum. Olhares indígenas apontam para outro futuro possível. Revista Arte! Brasileiros, 18 abr. 2020. Disponível em: https://artebrasileiros.com.br/arte/olhares-indigenas-apontam-para-outro-futuro-possivel/. Acesso em: 24 out. 2021.
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- SESC. Encontros ameríndios. Catálogo de exposição. São Paulo: Sesc Vila Mariana, 2021. Disponível em: https://issuu.com/sescsp/docs/encontros_amerindios. Acesso em: 24 out. 2021.
- VIEIRA, Douglas. O jeito é comprar. Revista Trip, São Paulo, 15 jan. 2018. Disponível em: https://revistatrip.uol.com.br/trip/coletivo-de-artistas-indigenas-mahku-da-etnia-huni-kuin-vende-telas-para-poder-comprar-mata-virgem. Acesso em: 24 out. 2021.
Como citar
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COLETIVO MAHKU.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/grupo636133/coletivo-mahku. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7